Você já sabe que, em um texto narrativo, há uma voz que conta para o leitor quando, como, onde, por que e com quem algum fato ocorreu. A essa espécie de voz, que coordena a sequência de ações e a entrada e saída de personagens, bem como seus respectivos destinos, chama-se narrador.
Só que, nesse mesmo tipo de texto, há também a presença das falas dos personagens (discurso direto ou indireto), derivando daí a necessidade de uma pontuação que permita a perfeita identificação de cada momento: quando é o narrador a narrar; quando são os personagens a falar uns com os outros. Em geral, a presença dos verbos, dos pronomes e dos advérbios permite ao leitor hábil essa identificação. Por isso autores como José Saramago dispensavam a pontuação clássica. Mas, em se tratando de redação para avaliação, as regras gramaticais de pontuação dos discursos devem ser seguidas.
No texto abaixo, os sinais de pontuação dos discursos foram intencionalmente eliminados. Que tal se você tentasse, seguindo as prescrições sobre a pontuação dos discursos, pontuá-lo corretamente? Repare que, como cada discurso direto corresponde a um parágrafo, o resultado será um texto com uma paragrafação diferente desta que você verá. Vamos tentar?
Uma dica: leia tudo primeiro, tentando identificar a voz do narrador, as vozes dos personagens e a alternância de fala entre uns e outros.
O encontro
Marcelo Ferreira de Menezes
Vicente havia acabado de sair do banho e já estava com calor. Vestiu uma blusa de algodão e colocou a calça jeans surrada. Era seu primeiro encontro às escuras. Um amigo tinha dito para ele que era grande a chance de se conhecer alguém interessante pela internet. Na pior das situações, era voltar para casa sozinho. É isso aí, meu velho! Eu já fui nessa! Quem não arrisca não petisca, tá ligado? provocou o amigo, dando-lhe um pequeno tapa nas costas. Ah, Otávio! Só você mesmo para me fazer passar por um papel desses, retrucou Vicente. Eu penso que não tenho mais idade para isso. Além do mais... O quê! Tá se achando velho?! Tudo bem que você já não é mais nenhum garoto, mas não vamos esculachar o prego! Pensa nas gatas, bicho! Nas gatas! continuou incentivando Otávio. Tá bom! Tá bom! Eu vou! Pronto! Por causa dessa conversa é que ele então estava ali, naquela sorveteria. Achou um pouco estranho que ela fizesse questão de uma sorveteria, mas o que fazer? Já estava cansado de ser solteirão. Ela dissera para ele no chat que estaria de blusa vermelha, calça amarela e tênis verde limão. Que tipo de mulher se veste assim?, ele conjeturou. Então viu quando ela entrou. Não era o que ele tinha pensado que poderia encontrar. Tinha imaginado uma mulher de uns quarenta, pelo menos; só que ali, à entrada da sorveteria, estava uma menina de uns catorze anos, vestida do mesmo jeito. Encabulado, Vicente sentiu vergonha por também ter, digamos, exagerado na idade; mas para menos. Levantou-se constrangido de sua mesa e atravessou o salão para deixar a sorveteria. Ao passar pela menina, ela lhe perguntou, Tio, o senhor tem horas? Ele parou, olhou para a menina e respondeu, sim; já são quase dez horas. Hora de criança estar em casa. A menina riu sem graça. Vicente desceu a rua decidido a não voltar mais às aulas de informática para a terceira idade. Dar ouvidos a Otávio? Nunca mais! Cinco minutos mais tarde, uma senhora vestida de preto entra na sorveteria e vai direto à balconista, também uma senhora. E aí? Você viu alguém, Cecília? perguntou à atendente. Sentou-se um senhor ali naquela mesa, mas foi embora rápido. Era bonito? Bem-apanhado, respondeu Cecília. Será que era ele? Ah, não dá pra saber. Será que fiz bem em mentir sobre a minha roupa? Ah! Meu Deus! Como eu sou insegura!