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A elaboração do texto dissertativo

          Para iniciarmos nosso trabalho com dissertação, propomos a você, como ponto de partida, uma atividade voltada para a introdução. Leia com atenção os dois parágrafos a seguir:



 I-      De uma maneira geral, todos temem o envelhecimento. Isso é algo perfeitamente compreensível, uma vez que ele pressupõe mesmo uma acentuada e irreversível degeneração física, assinalando que o indivíduo talvez se encontre mais próximo da morte. Contudo, apesar de todos os problemas a que estão sujeitos os idosos, essa é uma fase de maturidade espiritual, de consolidação do conhecimento e valorização da experiência; é uma fase na qual pode haver, sim, felicidade, pois ser feliz é uma opção que independe de idade. Além disso, todo temor é uma fuga, e não se pode fugir do envelhecimento; o melhor é assumir desde cedo uma atitude preventiva, criar bons hábitos, para que se esteja preparado para quando, e se, essa fase chegar.


II-      De maneira geral, costuma-se admitir que a velhice é uma fase de maturidade espiritual, de consolidação do conhecimento e valorização da experiência; que essa é uma fase na qual pode haver ainda felicidade, pois ser feliz é uma opção que independe de idade, e que basta cultivar bons hábitos para se ter uma velhice saudável. Contudo essas afirmações são somente uma forma bem-intencionada de mascarar uma dura realidade. Na verdade os problemas relacionados ao envelhecimento são graves, irreversíveis e desanimadores. Ser idoso é quase o mesmo que estar morto; a felicidade não é exclusividade dos jovens, mas é bem mais fácil ser feliz durante a juventude, quando se tem saúde e vigor físico. Sob esse ponto de vista, temer a velhice é algo justificável, na medida em que esse temor pode nos impelir a viver mais intensamente cada momento, já que o envelhecimento e a sua conseqüência natural, a morte, são mesmo inevitáveis.


          Eles equivalem, na verdade, à introdução de dois textos que partiram de um mesmo tema, mas com posicionamentos opostos.
          Você seria capaz de identificar, primeiramente, o assunto de que tratam? Assunto, é bom que fique claro, refere-se ao universo maior ao qual o tema pertence. Para identificá-lo, um procedimento útil é tentar expressá-lo por meio de um substantivo abstrato. Exemplos: Política, Educação, Violência. Às vezes, esses substantivos podem vir acompanhados de uma expressão determinante, para restringi-los um pouco mais: Política Social, Educação no Trânsito, Violência contra a Mulher.
          Entendeu? Bom, identificado o assunto, passe agora para o tema, que é uma delimitação do assunto. O tema é a proposta de dissertação propriamente dita; nada mais é do que a abordagem de um aspecto do assunto sugerida para análise com relação à qual se deve definir um posicionamento a favor ou contra.
E aí? Você se arrisca a dizer qual é o tema em pauta? O que está sendo analisado? Vamos dar uma pista: existem algumas palavras que, pela sua inquestionável importância, constituem o que se chama de palavras-chave. Elas o conduzirão seguramente ao tema. Mas atenção: nessa busca pelo tema, você se deparará inevitavelmente com os chamados argumentos, que são ideias selecionadas para defender, sustentar uma outra ideia chamada posicionamento, também conhecida como ponto de vista, tese ou opinião.
          Então, vá por partes. Você deverá encontrar o assunto, o tema, os posicionamentos e os argumentos.
          Numa próxima postagem, daremos as respostas. Até lá e bom trabalho!

Postado em 08/03/2011.

O que deve conter a introdução

          Conforme combinado, daremos agora as respostas ao que foi pedido na postagem anterior.
          Como primeiro passo, solicitou-se que o assunto fosse identificado. Logo de início, é possível perceber que os textos tratam da velhice.


duarterego.blogspot.com

          Ótimo. Já sabemos qual é o assunto. Mas limitar-se a ele ainda é insuficiente para se definir um posicionamento, pois é necessária uma abordagem dentro do assunto que dê margem a análise e discussão. Afinal, o que está sendo proposto para se discutir com relação à velhice?
          Para ter certeza da abordagem feita, você deve selecionar as palavras-chave. Então vamos lá!
          Em I e em II, podemos selecionar as seguintes palavras: envelhecimento, degeneração física, morte, idosos, maturidade espiritual, consolidação do conhecimento, valorização da experiência, felicidade, idade, temor, fuga, atitude preventiva, bons hábitos, velhice, dura realidade, problemas, jovens, juventude, saúde, vigor físico.
          O passo agora é relacioná-las entre si para se chegar ao tema.
          Todas elas (as quais, diga-se de passagem, são impreterivelmente substantivos, sendo alguns acompanhados de adjetivos ou locuções adjetivas) estão, de alguma forma, ligadas à ideia de velhice, no que se refere quer a aspectos positivos, quer a aspectos negativos dessa fase da vida humana. Feita essa seleção, retorna-se, então, aos textos a fim de se encontrar alguma frase que contextualize, justifique o emprego dessas palavras. Veja: Em I, o trecho "todos temem o envelhecimento", na primeira linha, é bastante significativo. Em II, há uma frase igualmente esclarecedora: " temer a velhice é algo justificável".
          Diante da evidência das frases, ancorada numa leitura crítica e seletiva, chegamos finalmente ao tão procurado tema: o medo da velhice. A fim de que não pairem quaisquer dúvidas a respeito disso, é interessante que você formule uma pergunta a partir do tema: Os problemas que envolvem o envelhecimento humano devem motivar qualquer tipo de temor?
          Para respondê-la, você deve fazer uma breve consideração sobre as principais questões que envolvem o problema exposto. Nesse momento é importante considerar todas as nuances da questão e investigar o seu conhecimento prévio sobre o tema, sua experiência de vida, as informações factuais e teóricas sobre ele, dados comprováveis, senso comum, etc. Com isso, você descobrirá a sua opinião a respeito do tema, que nada mais é do que um ponto de vista.
          E então? Qual o posicionamento em I e em II? Faça a pergunta Devemos temer o envelhecimento? aos textos e encontre alguma frase que lhe sirva de resposta.
          Por exemplo, em I, o trecho "... apesar de todos os problemas a que estão sujeitos os idosos, essa é uma fase de maturidade espiritual, de consolidação do conhecimento e valorização da experiência..." pode ser considerado uma resposta negativa à pergunta, o que revela um posicionamento segundo o qual não se deve temer a velhice.
          Aproveitando a pergunta anterior, fazemos outra iniciando com Por que... : Por que não devemos temer o envelhecimento? A(s) resposta(s) a essa pergunta constitui(em)-se no(s) argumento(s).
          Agora que você já sabe o assunto, o tema e o posicionamento do texto I, fica fácil encontrar os argumentos. Basta ler novamente o texto com cuidado, atentando para o uso coerente das conjunções e locuções, que desempenham uma função crucial na construção da coerência textual, sobretudo em dissertação. E é isso o que faremos neste momento:

          I- De uma maneira geral, todos temem o envelhecimento. Isso é algo perfeitamente compreensível, uma vez que ele pressupõe mesmo uma acentuada e irreversível degeneração física, assinalando que o indivíduo talvez se encontre mais próximo da morte. Contudo, apesar de todos os problemas a que estão sujeitos os idosos, essa é uma fase de maturidade espiritual, de consolidação do conhecimento e valorização da experiência; é uma fase na qual pode haver, sim, felicidade, pois ser feliz é uma opção que independe de idade. Além disso, todo temor é uma fuga, e não se pode fugir do envelhecimento; o melhor é assumir desde cedo uma atitude preventiva, criar bons hábitos, para que se esteja preparado para quando, e se, essa fase chegar.

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          Logo no início do texto, deparamo-nos com uma expressão (De uma maneira geral) que, em razão do sentido que encerra, tem por função atribuir à ideia por ela introduzida o valor de opinião consensual. Assim, o efeito é o de que a maioria das pessoas considera que o envelhecimento é temido por todos. Em seguida, o produtor do texto apresenta uma justificativa, (uma vez que) para tal consenso, que é, portanto, um argumento contrário ao seu: "ele [o envelhecimento] pressupõe mesmo uma acentuada e irreversível degeneração física, assinalando que o indivíduo talvez se encontre mais próximo da morte". No entanto, o emprego da conjunção adversativa contudo e da locução prepositiva com valor concessivo apesar de quebra com essa linha de raciocínio ao introduzir uma ideia oposta à expressa anteriormente, criando-se uma expectativa no leitor de que o posicionamento adotado é oposto ao da maioria, fato que se confirma na oração principal, constituindo-se, ela própria, em um argumento: [porque] 1. "essa é uma fase de maturidade espiritual, de consolidação do conhecimento e valorização da experiência".
          A oração seguinte é igualmente um outro argumento que justifica o posicionamento adotado: [porque] 2. "é uma fase na qual pode haver, sim, felicidade, pois ser feliz é uma opção que independe de idade". E finalmente a expressão além disso acrescenta um último argumento para se defender a opinião: [porque] 3. "todo temor é uma fuga, e não se pode fugir do envelhecimento".
           Vamos agora para o texto II?
          Primeiramente, devemos encontrar uma frase que nos aponte o posicionamento assumido, servindo de resposta à pergunta elaborada a partir do tema. E a frase é esta: "temer a velhice é algo justificável". De imediato, certificamo-nos de que a opinião é oposta à do texto I, revelando um posicionamento de acordo com o qual devemos sim temer a velhice. Logicamente, os argumentos não poderão ser os mesmos, e, mais uma vez, devemos recorrer às conjunções para encontrá-los:

          II- De maneira geral, costuma-se admitir que a velhice é uma fase de maturidade espiritual, de consolidação do conhecimento e valorização da experiência; que essa é uma fase na qual pode haver ainda felicidade, pois ser feliz é uma opção que independe de idade, e que basta cultivar bons hábitos para se ter uma velhice saudável. Contudo essas afirmações são somente uma forma bem-intencionada de mascarar uma dura realidade. Na verdade os problemas relacionados ao envelhecimento são graves, irreversíveis e desanimadores. Ser idoso é quase o mesmo que estar morto; a felicidade não é exclusividade dos jovens, mas é bem mais fácil ser feliz durante a juventude, quando se tem saúde e vigor físico. Sob esse ponto de vista, temer a velhice é algo justificável, na medida em que esse temor pode nos impelir a viver mais intensamente cada momento, já que o envelhecimento e a sua consequência natural, a morte, são mesmo inevitáveis.

magusfaber.wordpress.com

           Novamente o texto se inicia com uma expressão (De uma maneira geral) que introduz a opinião colocada estrategicamente pelo produtor do texto como consensual a respeito da velhice. Mas atenção! Os argumentos agora se inverteram. O que em I serviu como argumento para sustentar a opinião do produtor do texto, em II se refere justamente ao ponto de vista considerado da maioria das pessoas. Opondo-se a este, podemos enumerar os seguintes argumentos: 1. ser idoso é quase o mesmo que estar morto; 2. a felicidade não é exclusividade dos jovens, mas é bem mais fácil ser feliz durante a juventude, quando se tem saúde e vigor físico (aqui a adversativa é coerentemente empregada, uma vez que destaca o argumento que sustenta o novo posicionamento); 3. esse temor pode nos impelir a viver mais intensamente cada momento, já que o envelhecimento e a sua consequência natural, a morte, são mesmo inevitáveis.

          Veja só quanta informação importante se pode extrair de apenas um parágrafo, que, no caso, é o da introdução do chamado esquema básico da dissertação, adotado no Curso de Redação da (*).
          Falaremos mais desse esquema, quando apresentarmos os outros parágrafos desse texto numa próxima postagem.

Postado em 08/03/2011.

(*) Refere-se o sinal à omissão do nome de uma instituição militar de ensino. 

A elaboração do texto dissertativo (Final) - Em 26/03/2011


Bem, na postagem anterior, tendo como foco de análise o tema medo da velhice, estudamos o parágrafo da introdução do texto dissertativo. Para tanto, adotamos o esquema básico de dissertação, retirado do livro Técnicas básicas de redação, editora Scipione, 1996, da autora Branca Granatic. Esse esquema, adotado na apostila do Curso de Redação da (*), é de fato muito útil, pois possibilita a quem escreve organizar as ideias, de modo a manter-se fiel ao tema, respeitando a estrutura da dissertação e garantindo a informatividade do texto.
Vimos que a introdução deve conter a apresentação do tema com o posicionamento explícito, acompanhado de três argumentos que o fundamentem. Essa técnica ajuda não só quem escreve, mas também quem lê, pois ambos já sabem, apenas com a leitura do primeiro parágrafo, que informações o texto deverá conter e em que ordem elas deverão aparecer.
“Mas, então, pra que escrever mais?”, você pode se perguntar. Pelo simples fato de que o objetivo principal de uma dissertação é convencer pelos argumentos. Como na introdução eles foram apenas citados, é preciso desenvolvê-los, explicá-los melhor, desmembrando-os em ideias secundárias, porém estreitamente relacionadas a eles.
Por esse motivo, os argumentos devem ser cuidadosamente selecionados, a fim de que sejam relevantes, pertinentes, coerentes e suficientemente desenvolvidos. É nesse momento que pesam o conhecimento e a análise crítica que se têm do assunto.
A seguir, serão transcritos os dois textos na íntegra. O primeiro, “A vitória da Natureza”, aponta argumentos para não se temer a velhice. O segundo, “Formas de autoengano”, apresenta, portanto, as razões pelas quais devemos temê-la.

Rigorosamente redigidos de acordo com os parâmetros do esquema básico, ambos os textos contêm cinco parágrafos, dos quais o primeiro equivale à introdução, o segundo, o terceiro e o quarto referem-se, respectivamente, aos três argumentos citados na introdução e compõem o chamado desenvolvimento e o quinto e último destina-se à conclusão.
Propositalmente concebidos com posicionamentos opostos a respeito de um mesmo tema, os textos se valem de informações em comum, mas obviamente organizadas de maneira diferente, pois os argumentos têm de ser contrários. Para ajudá-lo a visualizá-los com mais clareza, eles foram destacados nos textos com cores diferentes. Em A vitória da Natureza, os argumentos que sustentam o posicionamento adotado estão em verde; os trechos em azul equivalem, portanto, aos argumentos contrários, que são justamente os utilizados para defender o posicionamento em Formas de autoengano.

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A vitória da Natureza
Prof. Marcelo F. de Menezes

De uma maneira geral, todos temem o envelhecimento. Isso é algo perfeitamente compreensível, uma vez que ele pressupõe mesmo uma acentuada e irreversível degeneração física, assinalando que o indivíduo talvez se encontre mais próximo da morte. Contudo, apesar de todos os problemas a que estão sujeitos os idosos, (1) essa é uma fase de maturidade espiritual, de consolidação do conhecimento e valorização da experiência; (2) é uma fase na qual pode haver, sim, felicidade, pois ser feliz é uma opção que independe de idade. Além disso, (3) todo temor é uma fuga, e não se pode fugir do envelhecimento; o melhor é assumir desde cedo uma atitude preventiva, criar bons hábitos, para que se esteja preparado para quando, e se, essa fase chegar.
Quando jovem, o ser humano passa por uma série de desafios para a construção e para o estabelecimento de sua personalidade diante do mundo. A insegurança e o medo são inimigos presentes a todo instante. Muitas dúvidas surgem nessa fase, e é apenas normal que erros sejam cometidos ao longo desse processo. (1) A sobrevivência a toda essa pressão pela busca da identidade é recompensada pela experiência e pela consolidação do conhecimento. Indivíduos mais idosos tendem a errar menos, a sofrer menos para tomar uma decisão qualquer. Além disso, há um fortalecimento espiritual que resulta em uma maior liberdade de ação e numa atitude mais positiva e confiante diante daquilo que no passado gerou angústia. Portanto, tornar-se idoso pode ser visto como uma recompensa da própria vida para aqueles que sabem chegar a esse patamar da existência.
Comumente existe a tendência a se enxergar juventude e felicidade como duas irmãs que caminham sempre juntas. Contudo, basta correr o olhar pelo teatro da vida para perceber que (2) isso não é inteiramente verdade. Há toda uma gama de exemplos que podem ser citados para demonstrar que a felicidade é tão somente um estado de espírito. Existem muitos jovens e até mesmo crianças que são fustigados por uma espécie de tristeza visível a todos. Em contrapartida, há idosos que irradiam em suas ações vigor, dinamismo e alegria, muitas vezes fazendo-se supor que são mais jovens do que a idade que possuem. A vida apresenta momentos de alegria e tristeza. Se não há como se evitarem os maus momentos, a felicidade, pelo menos, é uma questão de escolha, algo que jamais será regulado pela faixa etária.
Como disse Guimarães Rosa na voz de um de seus mais ilustres personagens, "Viver é muito perigoso". A cada rua que se atravessa, a cada esquina que se dobra, o inesperado está à espreita. Isso, entretanto, não é razão para que alguém se esconda do porvir, mesmo porque há perigos que não se transformam em acidentes. (3) O envelhecimento é algo natural e inevitável; não se pode fugir dele. Mas, diferentemente de muitos acidentes, é algo que pode ser previsto. Sendo apenas mais um aspecto dessa vida tão múltipla, o melhor é transformar o medo em uma atitude preventiva, cultivando bons hábitos para que se alcance essa fase com saúde e lucidez. Isso pode permitir que alguém continue a gozar plenamente tudo de melhor que existe na vida.
O homem se esforçou muito (e continua a se esforçar) ao longo dos séculos para desvendar os mistérios que envolvem o problema da existência. Graças a todo esse esforço, a humanidade obteve resultados animadores no campo da longevidade, que hoje já é uma realidade para muitos. Sob essa perspectiva é que a maturidade física deve ser encarada. Assim é que a velhice pode ser vista como uma vitória. Portanto, em vez do conhecido temor e da melancolia tão associadas a essa fase, há na verdade muito o que se festejar quando se alcançam idades mais avançadas.


sitiodasideias.blogspot.com

Formas de autoengano
Prof. Marcelo F. de Menezes

De maneira geral, costuma-se admitir que a velhice é uma fase de maturidade espiritual, de consolidação do conhecimento e valorização da experiência; que essa é uma fase na qual pode haver ainda felicidade, pois ser feliz é uma opção que independe de idade, e que basta cultivar bons hábitos para se ter uma velhice saudável. Contudo essas afirmações são somente uma forma bem-intencionada de mascarar uma dura realidade. Na verdade os problemas relacionados ao envelhecimento são graves, irreversíveis e desanimadores. (1) Ser idoso é quase o mesmo que estar morto; a felicidade não é exclusividade dos jovens, mas (2) é bem mais fácil ser feliz durante a juventude, quando se tem saúde e vigor físico. (3) Sob esse ponto de vista, temer a velhice é algo justificável, na medida em que esse temor pode nos impelir a viver mais intensamente cada momento, já que o envelhecimento e a sua consequência natural, a morte, são mesmo inevitáveis.
É sempre interessante conhecer pessoas idosas que aparentam vigor físico e boa disposição. Isso parece reforçar a ideia de que é plenamente possível conservar a energia da juventude à medida que os anos avançam. No entanto, ainda que, durante um período, isso possa ser demonstrado, (1) o tempo é o senhor soberano das forças físicas e da saúde. Quando se é jovem, as palavras cansaço e dor quase não são ouvidas. Tem-se disposição de sobra para a atividade que se quiser praticar. Já na velhice, as oportunidades estão sempre restritas ao potencial de um corpo cansado, insuficientemente sustentado por sombras de músculos e ossos frágeis. Aliado a esse fator, a perda paulatina da participação dos sentidos no dia a dia transforma a vida numa batalha ingrata. E, com relação a esses problemas, a maturidade espiritual pouco ou quase nada pode.
Os publicitários sempre se apressam em exibir senhores e senhoras lépidos, risonhos, em atitudes pertinentes às crianças, quase em êxtase nirvânico em propagandas promovendo planos de saúde, bancos, cosméticos e vitaminas. Vendem a ideia de que é na velhice que se aprende finalmente a viver, que a felicidade está presente ainda nessa fase. Mas (2) as frustrações, os medos, a ansiedade, as decepções não desaparecem de suas vidas só porque chegaram aos oitenta, noventa anos. É bem mais fácil a superação desses problemas durante a juventude, enquanto ainda se tem tempo de sobra para se desviar o curso das adversidades. Portanto, é bem mais fácil ser feliz aos vinte, trinta, no máximo quarenta anos que no final da vida.
Todos pensam que o temor à morte é algo injustificável, que deve ser ignorado ou até mesmo vencido. Mas (3) o medo, sob um aspecto biológico, é algo saudável, pois prepara os indivíduos para uma reação diante de um perigo iminente. A vida na Terra é algo curto demais; nada mais justo que alguém tema por perder algo tão maravilhoso e único. A questão está em que esse medo não deve gerar paralisia, mas, sim, uma atitude de afirmação da vida. Por isso é tão importante que ele seja visto como um símbolo de que cada um deve viver tudo o que puder da forma mais intensa e ávida que puder. "Carpe diem", diziam os antigos. "Aproveite o dia!", grita a vida. Um pouco de medo pode ser um bom remédio para tirar uma pessoa da imobilidade na qual se encontra, conclamando-a a viver de peito aberto, enquanto durar o vigor da juventude.
Todos são livres para formularem conceitos sobre as vantagens da velhice, acreditarem neles e os divulgarem conforme bem entenderem. Contudo, a realidade, por mais colorida que seja a maquiagem que lhe ponham na face, sempre estará espreitando a todos com seus olhos duramente sinceros. Se a velhice fosse a melhor fase da vida dos seres, a Natureza, que é sábia, os teria feito nascer primeiro idosos, para depois retroceder o relógio biológico de cada um, como o personagem de um famoso filme. Querer que algo seja diferente do que realmente é, infelizmente, não é o suficiente para modificar os fatos.


Comentários

Assumir um posicionamento não significa ignorar o ponto de vista contrário

Como já foi dito anteriormente, os dois textos se valem das mesmas informações para defender posicionamentos opostos com relação ao medo da velhice. Mas como isso é possível sem que o texto fique confuso e incoerente?
Em dissertação, a argumentação tem uma importância fundamental. Saber articular as ideias, ou seja, organizá-las de forma a parecerem naturalmente convincentes é uma condição básica, e isso demanda conhecimento, visão crítica e habilidade linguística para lidar justamente com os chamados articuladores sintáticos. Por essa razão, as conjunções desempenham um importante papel na construção da coerência textual. Leia o seguinte trecho retirado de Formas de autoengano:


Os publicitários sempre se apressam em exibir senhores e senhoras lépidos, risonhos, em atitudes pertinentes às crianças, quase em êxtase nirvânico em propagandas promovendo planos de saúde, bancos, cosméticos e vitaminas. Vendem a ideia de que é na velhice que se aprende finalmente a viver, que a felicidade está presente ainda nessa fase. Mas (2) as frustrações, os medos, a ansiedade, as decepções não desaparecem de suas vidas só porque chegaram aos oitenta, noventa anos. É bem mais fácil a superação desses problemas durante a juventude, enquanto ainda se tem tempo de sobra para se desviar o curso das adversidades. Portanto, é bem mais fácil ser feliz aos vinte, trinta, no máximo quarenta anos que no final da vida.”

Para desenvolver o argumento de que é bem mais fácil ser feliz durante a juventude, quando se tem saúde e vigor físico, o autor não ignorou o posicionamento contrário, destacado em verde no texto, mas partiu dele para apresentar o seu próprio ponto de vista. Isso é uma estratégia argumentativa pela qual se antecipa o argumento oposto para refutá-lo. E como é feito isso? No exemplo citado, pelo uso da conjunção adversativa mas, cuja função é justamente unir ideias opostas, dando destaque àquela por ela introduzida, que, no texto, está em azul. Assim, obtém-se o efeito persuasivo de que a ideia apresentada por último tem mais peso argumentativo; é, portanto, mais convincente que a primeira. A conclusão, introduzida pela conjunção conclusiva portanto, reforça ainda mais o ponto de vista assumido, como que colocando um ponto final à discussão.
O mesmo procedimento se verifica em A vitória da Natureza, agora logicamente com as ideias invertidas:

Comumente existe a tendência a se enxergar juventude e felicidade como duas irmãs que caminham sempre juntas. Contudo, basta correr o olhar pelo teatro da vida para perceber que (2) isso não é inteiramente verdade. Há toda uma gama de exemplos que podem ser citados para demonstrar que a felicidade é tão somente um estado de espírito. Existem muitos jovens e até mesmo crianças que são fustigados por uma espécie de tristeza visível a todos. Em contrapartida, há idosos que irradiam em suas ações vigor, dinamismo e alegria, muitas vezes fazendo-se supor que são mais jovens do que a idade que possuem. A vida apresenta momentos de alegria e tristeza. Se não há como se evitarem os maus momentos, a felicidade, pelo menos, é uma questão de escolha, algo que jamais será regulado pela faixa etária.

A estratégia argumentativa da conjunção adversativa contudo é a mesma, mas agora ela introduz a ideia que no outro texto foi refutada, a saber, de que a velhice é uma fase na qual pode haver, sim, felicidade, pois ser feliz é uma opção que independe de idade. Assim, o que antes tinha menos importância, agora adquiriu força quase que incontestável.
Como você pode facilmente constatar, não há muito segredo em se articularem as ideias para se montar uma argumentação coerente. É preciso, sim, ter o mínimo de conhecimento do emprego das conjunções e, antes de tudo, saber qual o posicionamento que se quer defender.

Argumentos coerentes, pertinentes e relevantes resultam de uma visão crítica que se baseia na realidade

De nada adianta utilizar palavras bonitas se elas revestem ideias vazias de comprovação na realidade. Isso significa que, para convencer, é preciso levar em consideração a realidade do tema tomado como problema na dissertação.
Dessa forma, assumir um posicionamento requer um compromisso por parte de quem argumenta por meio das ideias expostas. O texto deve ser uma espécie de identidade de quem o escreveu, o que significa que não se pode falar qualquer coisa de qualquer jeito. Às vezes, alguns temas, como o medo da velhice, possibilitam-nos assumir posicionamentos opostos, mas, para isso, é necessária uma argumentação lúcida, que revele maturidade argumentativa por parte de quem escreve, já que a dissertação é um tipo de texto racional, que se baseia fundamentalmente em provas, testemunhos, experiências de vida facilmente comprovadas. E é isso que podemos encontrar nos parágrafos a seguir, retirados de A vitória da Natureza (A) e Formas de autoengano (B), respectivamente:

A - “Como disse Guimarães Rosa na voz de um de seus mais ilustres personagens, 'Viver é muito perigoso'. A cada rua que se atravessa, a cada esquina que se dobra, o inesperado está à espreita. Isso, entretanto, não é razão para que alguém se esconda do porvir, mesmo porque há perigos que não se transformam em acidentes. (3) O envelhecimento é algo natural e inevitável; não se pode fugir dele. Mas, diferentemente de muitos acidentes, é algo que pode ser previsto. Sendo apenas mais um aspecto dessa vida tão múltipla, o melhor é transformar o medo em uma atitude preventiva, cultivando bons hábitos para que se alcance essa fase com saúde e lucidez. Isso pode permitir que alguém continue a gozar plenamente tudo de melhor que existe na vida.

B - Todos pensam que o temor à morte é algo injustificável, que deve ser ignorado ou até mesmo vencido. Mas (3) o medo, sob um aspecto biológico, é algo saudável, pois prepara os indivíduos para uma reação diante de um perigo iminente. A vida na Terra é algo curto demais; nada mais justo que alguém tema por perder algo tão maravilhoso e único. A questão está em que esse medo não deve gerar paralisia, mas, sim, uma atitude de afirmação da vida. Por isso é tão importante que ele seja visto como um símbolo de que cada um deve viver tudo o que puder da forma mais intensa e ávida que puder. "Carpe diem", diziam os antigos. "Aproveite o dia!", grita a vida. Um pouco de medo pode ser um bom remédio para tirar uma pessoa da imobilidade na qual se encontra, conclamando-a a viver de peito aberto, enquanto durar o vigor da juventude.”

Argumentos bem-desenvolvidos garantem a progressão

Convencer pelos argumentos não é uma tarefa impossível, mas exige de quem se propõe a fazê-lo uma imersão no problema, de modo que o leitor perceba, a partir da leitura do texto, uma entrega por parte de quem o produziu. E esse efeito só é atingido se sinceramente houve essa entrega. Como perceber isso? Simples. Leia os parágrafos abaixo:

A - “Quando jovem, o ser humano passa por uma série de desafios para a construção e para o estabelecimento de sua personalidade diante do mundo. A insegurança e o medo são inimigos presentes a todo instante. Muitas dúvidas surgem nessa fase, e é apenas normal que erros sejam cometidos ao longo desse processo. (1) A sobrevivência a toda essa pressão pela busca da identidade é recompensada pela experiência e pela consolidação do conhecimento. Indivíduos mais idosos tendem a errar menos, a sofrer menos para tomar uma decisão qualquer. Além disso, há um fortalecimento espiritual que resulta em uma maior liberdade de ação e numa atitude mais positiva e confiante diante daquilo que no passado gerou angústia. Portanto, tornar-se idoso pode ser visto como uma recompensa da própria vida para aqueles que sabem chegar a esse patamar da existência.

B - “É sempre interessante conhecer pessoas idosas que aparentam vigor físico e boa disposição. Isso parece reforçar a ideia de que é plenamente possível conservar a energia da juventude à medida que os anos avançam. No entanto, ainda que, durante um período, isso possa ser demonstrado, (1) o tempo é o senhor soberano das forças físicas e da saúde. Quando se é jovem, as palavras cansaço e dor quase não são ouvidas. Tem-se disposição de sobra para atividade que se quiser praticar. Já na velhice, as oportunidades estão sempre restritas ao potencial de um corpo cansado, insuficientemente sustentado por sombras de músculos e ossos frágeis. Aliado a esse fator, a perda paulatina da participação dos sentidos no dia a dia transforma a vida numa batalha ingrata. E, com relação a esses problemas, a maturidade espiritual pouco ou quase nada pode.”

Por um acaso, ao ler cada um desses parágrafos, alguma ideia lhe pareceu sem explicação ou mesmo “forçada”? Provavelmente não foi essa sua impressão, e sabe por quê? Porque o produtor não se privou de explicitar, explicar, desenvolver o argumento, desmembrando-o em ideias secundárias, mas perfeitamente decorrentes dele. O leitor como que é conduzido por um raciocínio que o transporta sem rodeios nem subterfúgios ao longo do texto. As ideias vão sendo acrescentadas de maneira lógica e, por efeito de estratégias argumentativas, natural, e o texto vai adquirindo conteúdo. Isso é o que chamamos de progressão textual.

Concluir um texto é reafirmar o posicionamento, acrescentando um comentário

De tudo o que foi exposto, o que se pode concluir? Ao chegar ao final do texto, o leitor espera do produtor um parecer definitivo e sincero a respeito do tema. A conclusão deve ser, assim, uma retomada da introdução com um tom de encerramento. Por essa razão, cabem reflexões pessoais, ainda que sem marcas de primeira pessoa. Veja nos parágrafos abaixo:

A - “O homem se esforçou muito (e continua a se esforçar) ao longo dos séculos para desvendar os mistérios que envolvem o problema da existência. Graças a todo esse esforço, a humanidade obteve resultados animadores no campo da longevidade, que hoje já é uma realidade para muitos. Sob essa perspectiva é que a maturidade física deve ser encarada. Assim é que a velhice pode ser vista como uma vitória. Portanto, em vez do conhecido temor e da melancolia tão associadas a essa fase, há na verdade muito o que se festejar quando se alcançam idades mais avançadas.”

B - “Todos são livres para formularem conceitos sobre as vantagens da velhice, acreditarem neles e os divulgarem conforme bem entenderem. Contudo, a realidade, por mais colorida que seja a maquiagem que lhe ponham na face, sempre estará espreitando a todos com seus olhos duramente sinceros. Se a velhice fosse a melhor fase da vida dos seres, a Natureza, que é sábia, os teria feito nascer primeiro idosos, para depois retroceder o relógio biológico de cada um, como o personagem de um famoso filme. Querer que algo seja diferente do que realmente é, infelizmente, não é o suficiente para modificar os fatos.”

Não se esqueça de, ao final, escrever o título

Embora seja a primeira informação de um texto, aconselha-se que o título seja o último elemento a ser elaborado. Isso porque, já tendo definido o tema e o posicionamento, fica mais fácil se criar o título, que deve ser curto e, no caso da dissertação, se possível resumir o tema e, ao mesmo tempo, revelar o posicionamento, como fazem os bons editoriais de jornal.
Por exemplo, os títulos A vitória da Natureza e Formas de autoengano geram uma expectativa no leitor que vai se confirmar posteriormente com a leitura. No primeiro, a Natureza, metáfora para a própria vida, ser vitoriosa significa, aplicando-se ao tema, a vitória da pessoa mais velha, que, ao viver mais longamente, venceu a morte por mais tempo. Já no segundo, a ideia de que a velhice não é algo positivo é sugerida pelo substantivo autoengano.

 Esses foram alguns aspectos dos quais é necessário se ter conhecimento para se redigir uma dissertação satisfatória. Existem ainda muitos outros que oportunamente comentaremos neste blog. Para conhecê-los, basta continuar acessando o LetrasEEARtes. Até a próxima postagem.

(*) Refere-se o sinal à omissão do nome de uma instituição militar de ensino. 

Interpretação de tema: missão possível (Em 23/04/2011)

missionariodoblogger.blogspot.com

        Olá! Recentemente, fizemos uma análise de aspectos importantes que um bom texto dissertativo deve apresentar, como posicionamento claro, progressão textual, argumentos bem-desenvolvidos, relevantes e coerentes, emprego correto dos articuladores sintáticos, adequação do título.
         Indiscutivelmente, esses elementos são essenciais à construção do texto, mas, quando se trata de uma produção textual que deve atender a um tema, todo o esforço empenhado nessa produção só terá valor se aplicado adequadamente ao desenvolvimento desse tema. Isso quer dizer que, ainda que, do ponto de vista textual propriamente dito — estruturação das frases e dos parágrafos, precisão vocabular, fluência da linguagem, correção gramatical, coerência das ideias —, a redação esteja impecável, se a abordagem do tema for parcial, o Estilo poderá sofrer um desconto da metade da nota, dependendo do critério da banca, ou mesmo receber grau zero, no caso de uma abordagem totalmente inadequada.
         Podemos concluir disso, portanto, que a correta interpretação do tema é uma condição primeira, embora não suficiente, para se obter um bom êxito no Estilo. Dessa forma, para escrevermos uma boa redação, devemos nos preocupar primeiramente em fazer uma boa leitura do tema.
         Até esse momento, procuramos oferecer a você um material que contemplasse as habilidades da escrita aplicadas a uma redação escolar de estrutura dissertativa (e esse material não se esgota aqui, apresentaremos muito mais conteúdo referente a esse assunto). Agora, vamos nos concentrar um pouco mais nas habilidades da leitura.

          Ler e interpretar é só começar

         Como estávamos dizendo, uma boa produção textual requer uma leitura atenta, que extraia do tema o máximo de informação relevante. Nesse sentido, quanto maior o seu conhecimento linguístico, prévio e de mundo, maior a sua capacidade de interpretação, pois consequentemente a sua observação crítica se ampliará.
         E em se tratando de temas de redação, essa leitura crítica é de tal modo imprescindível que até mesmo os mínimos detalhes não podem passar despercebidos por aquele que se vê diante da (difícil?) missão de interpretar um tema de redação: título, figura, fonte, data, destaques em itálico, em negrito, palavras ou frases entre aspas, enfim, tudo em um tema deve ser considerado no momento da leitura.
         Mas por que toda essa preocupação? É mesmo necessária essa leitura tão detalhada e minuciosa? Não tenha dúvidas de que sim, e a razão é muito clara: tema é um exercício escolar de análise e interpretação, construído propositalmente para fins de produção textual. Visto dessa forma, o tema adquire um grau de importância tal que tudo passa a ter um porquê, o que significa que nada é gratuito, dispensável e muito menos insignificante, pois quem o elaborou (em geral, um ou mais de um professor) o fez com um objetivo único e específico: avaliar o desempenho linguístico da forma de expressão escrita do aluno.
         Quem lê e interpreta um tema não pode, portanto, fazer uma leitura superficial, desatenta e tampouco subestimar as informações ali contidas, achando que pode falar o que quiser do jeito que quiser. Essa atitude é, no mínimo, ingênua e inconsequente; ingênua porque ignora o caráter avaliativo de tal exercício, e inconsequente porque, em termos práticos, esse tipo de postura se refletirá inevitavelmente na nota.
         Assim, o melhor a se fazer é começar a adotar uma atitude compromissada e madura, com a seriedade que tal tipo de atividade requer. Mas como fazer isso? Na verdade, não existe uma fórmula exata para se fazer uma boa leitura; prova disso são as várias teorias que investigam os meandros dessa habilidade humana. No entanto, cientes das dificuldades que os alunos normalmente apresentam com relação a essa habilidade, procuramos oferecer aqui ao menos algumas orientações básicas que possam auxiliá-lo no “impenetrável” universo da interpretação.
         Para começo de conversa, é preciso que se tenha um mínimo de conhecimento do gênero conhecido no meio escolar como tema de redação.
         Concebido exclusivamente como uma proposta de interpretação que deverá gerar uma produção textual, os temas não apresentam um formato estanque; versam sobre os mais diferentes assuntos e possuem os mais variados estilos, que vão desde tema-título até temas que exigem a leitura de textos extensos para que o aluno estabeleça uma relação entre eles. Há também os chamados temas livres, ou seja, aqueles em que o próprio aluno escolhe o assunto sobre o qual deseja dissertar.
         No caso da instituição onde os coordenadores deste projeto lecionam, os temas apresentam um formato mais ou menos estável, o que, de certa forma, facilita a leitura e a interpretação, porque é possível se prever o estilo, embora as abordagens sejam sempre inéditas.

         Que tal testar a sua observação crítica? Numa primeira leitura, que elementos em comum você consegue perceber nos três temas seguintes?



jfpharma.com.br


  1. Humanos ou animais?

         Sacrificar um coelho para testar um xampu, impingir dor a um ratinho para criar um novo remédio, submeter indefesos macacos a torturantes experimentações cirúrgicas para obter novos conhecimentos sobre o cérebro. Um projeto de lei que tenta proibir o uso de animais em experimentos científicos, elaborado pelo vereador Cláudio Cavalcanti, da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, acabou por reacender uma antiga polêmica: é justo que animais continuem sendo utilizados como cobaias em testes de laboratório?

Redija um texto dissertativo defendendo seu ponto de vista com relação à questão.




corposaun.com

  1. De coração para coração

         Preocupados em aumentar o número de transplantes no país e encurtar o tempo de espera na fila dos futuros receptores, alguns deputados federais defendem a implantação de uma lei que transforme todo e qualquer cidadão em um doador de órgãos e tecidos em potencial, independente da expressão ou não de sua vontade.
         Essa proposta ainda nem chegou a ser debatida pelo Congresso, mas, caso fosse aprovada, na prática, ela funcionaria da seguinte maneira: em caso de morte, primeiro os cirurgiões retirariam os órgãos e tecidos aproveitáveis (coração, rins, fígado, córneas, etc.) e, somente após esse procedimento, a família poderia iniciar os cuidados com o falecido.

Através de um texto dissertativo, apresente seu ponto de vista sobre a questão e o defenda utilizando argumentos coerentes.



alvorecer-escriba.blogspot.com


  1. Países ricos decidem legalizar a prostituição

         Países do Primeiro Mundo estão agora adotando leis que tratam a prostituição como se fosse qualquer outro negócio. Neste mês, o governo da Bélgica apresentou um projeto de lei para legalizar os bordéis, medida que a Nova Zelândia adotou no mês passado. Há três anos, os holandeses legalizaram os bordéis, e as prostitutas passaram a ter os direitos de qualquer trabalhador: carteira assinada, plano de saúde e aposentadoria. Em contrapartida, vão descontar para a previdência e pagar imposto de renda, como todo mundo. A Alemanha adotou legislação semelhante no ano passado.

Qual é a sua opinião? Você concordaria com a legalização da prostituição no Brasil? A essa prática deve ser atribuído caráter de profissão, com legislação própria regendo direitos e deveres?
Redija um texto dissertativo em que seu ponto de vista seja defendido com argumentos coerentes e pertinentes.

         Se você é bom observador, percebeu, numa leitura mais global, que todos os temas se iniciam com um título curto em negrito, apresentam um pequeno texto e são encerrados por uma espécie de comando, também em negrito.
         Certo. E no que isso nos ajuda na interpretação? O título, por exemplo, antecipa, de forma resumida, o assunto de que tratará o texto. Quando estruturado dessa forma, ele nos é muito útil, pois nos auxilia no trabalho de interpretação. Veja o título do tema 3: Países ricos decidem legalizar a prostituição. Escrito na ordem direta, com linguagem concisa e objetiva, o título é altamente informativo e nos revela o assunto a ser abordado no texto. Este provavelmente fornecerá informações que confirmarão o conteúdo do título, além de nos servir como uma fonte de dados na qual podemos e devemos nos basear para o trabalho de análise.
         Mas nem sempre os títulos são autoexplicativos. Por seu caráter mais subjetivo, estão sempre à mercê do estilo de quem escreve e, com isso, por vezes assumem uma feição mais literária. É o caso, por exemplo, do título do tema 2: De coração para coração. Diferentemente do título do tema 3, o do tema 2 não se presta a antecipar resumidamente o assunto abordado, antes desperta, de maneira sugestiva, a curiosidade e a imaginação do leitor, incitando-o à leitura do texto.
         Na mesma linha do título do tema 2, o do tema 1 procura fazer um apelo ao leitor, motivando-o a ler o texto, já que se estrutura em forma de pergunta: Humanos ou animais? De qualquer maneira, em ambos os casos o leitor é conduzido à leitura do texto justamente para completar o sentido do título, tomando conhecimento, com isso, do assunto de que trata o tema.
         Enfim, qualquer que seja o estilo do título, tenha certeza de que ele sempre servirá como um elemento contextualizador indispensável à construção do sentido do tema.

         E por que os temas dissertativos em geral contêm textos longos, que por vezes parecem confundir mais do que esclarecer? Essa é uma falsa impressão que deve ser dissipada. A função dos textos, em temas dissertativos, é, na verdade, fundamental: eles situam o leitor no contexto do assunto focalizado, fornecendo informações relevantes em forma de fatos, dados estatísticos, testemunhos, exemplificações e outros, que devem ser levadas em conta no momento da reflexão pessoal para se estabelecer o posicionamento e para se selecionarem os argumentos. É sabido que as informações contidas no tema não são as únicas relacionadas ao assunto em questão; obviamente foram selecionadas e, portanto, revelam uma intenção por parte de quem as organizou, o que confirma o já dito anteriormente: nada é gratuito num tema, e o bom leitor deve conseguir captar essa intenção para, a partir dela, elaborar a sua dissertação.
         De fato, a leitura de um texto, por menor que ele seja, dá margem a mais de uma interpretação. Por essa razão, na EEAR preferimos, para facilitar a sua tarefa, colocar ao final um comando, que estipula o que deve ser analisado por você e, algumas vezes, como deve fazê-lo.

         Imagine, por exemplo, que o tema 3 viesse formado apenas pelo título e pelo texto:
         3) Países ricos decidem legalizar a prostituição

        Países do Primeiro Mundo estão agora adotando leis que tratam a prostituição como se fosse qualquer outro negócio. Neste mês, o governo da Bélgica apresentou um projeto de lei para legalizar os bordéis, medida que a Nova Zelândia adotou no mês passado. Há três anos, os holandeses legalizaram os bordéis, e as prostitutas passaram a ter os direitos de qualquer trabalhador: carteira assinada, plano de saúde e aposentadoria. Em contrapartida, vão descontar para a previdência e pagar imposto de renda, como todo mundo. A Alemanha adotou legislação semelhante no ano passado.

         Assim apresentado, o leitor poderia supor que o tema diz respeito tão somente à medida adotada pelos países citados no texto no que se refere à legalização da prostituição. Nesse caso, questões como Por que esses países aprovaram essa legalização e qual o impacto disso na sociedade?, ou Você concorda com a legalização da prostituição?, ou ainda A prostituição deve ser vista como uma profissão? seriam perfeitamente pertinentes, já que se baseariam nas palavras-chave (lembra-se?) encontradas no texto.
         No entanto, ao lermos o comando colocado ao final do tema Qual é a sua opinião? Você concordaria com a legalização da prostituição no Brasil? A essa prática deve ser atribuído caráter de profissão, com legislação própria regendo direitos e deveres? Redija um texto dissertativo em que seu ponto de vista seja defendido com argumentos coerentes e pertinentes, a abordagem do assunto torna-se mais restrita ainda, pois deve-se analisar, segundo o previsto, a legalização da prostituição no Brasil, o que muda totalmente o foco de análise.
         Uma coisa é considerar essa questão em países como Bélgica, Nova Zelândia, Holanda e Alemanha, cuja realidade sociopolítica de países de Primeiro Mundo é bem diferente da do Brasil. Mas atenção: ao solicitar que se analise a legalização da prostituição no Brasil, o aluno não pode simplesmente ignorar os países adeptos dessa prática. É certo que eles não são o foco de análise, mas, no mínimo, servem como parâmetro para você posicionar-se quanto ao que é pedido pelo comando. Essa legalização e tudo o que ela implica, apesar de já ser uma realidade em países de Primeiro Mundo, seriam viáveis num país como o Brasil? (e aí entram o conhecimento prévio e o de mundo que você tem sobre o assunto: qual o valor que uma atividade como a prostituição tem no Brasil; no que essa legalização contribuiria ou não para uma sociedade como a brasileira; o fato de essa legalização funcionar em alguns países de Primeiro Mundo é ou não garantia de que ela funcionaria também no Brasil). Nesse sentido, esses países seriam citados no seu texto pelo menos a título de exemplificação e/ou comparação.
         Essa seria a abordagem ideal, que não só atenderia ao estipulado pelo comando, como também levaria em consideração as informações contidas no tema, estabelecendo a devida hierarquia entre os elementos dentro da análise. Inadmissível seria, por exemplo, uma dissertação que analisasse a legalização da prostituição nos países do Primeiro Mundo e ignorasse essa medida no Brasil, pois, assim fazendo, o aluno estaria subvertendo o que foi pedido pelo tema, uma vez que estaria desconsiderando o comando. O mesmo pode-se dizer da dissertação que se propusesse a discorrer sobre a prostituição propriamente dita, sem sequer mencionar a sua legalização. Nesses casos, o aluno teria feito uma leitura superficial do tema e, por algum motivo sem explicação aparente, se atido a algumas palavras apenas, isolando-as do contexto em que aparecem.
         Veja que o tema é um todo que envolve título, texto e comando, cada qual desempenhando a sua função, harmoniosamente relacionados entre si e indissociáveis um do outro. Se um desses elementos é simplesmente abandonado, a abordagem já não será ideal e a nota provavelmente sofrerá descontos significativos.
          Então vamos ler um texto cuja abordagem tenha sido ideal? Faça você mesmo as considerações estilísticas do texto baseadas nos comentários da postagem anterior. Assim você estará praticando seu conhecimento teórico e desenvolvendo seu espírito crítico. Repare que o esquema adotado é o de prós e contras.



shirokyono3d.blogspot.com

A profissionalização da prostituição

Não se sabe a origem do dito, mas, em geral, costuma-se dizer que a prostituição é a “profissão” mais antiga do mundo. Isso não elimina, no entanto, toda a carga de preconceito agregada a essa atividade. Talvez, na tentativa de resolver esse e outros problemas mais graves, países do Primeiro Mundo estão começando a elaborar leis para transformá-la em profissão. Bélgica, Nova Zelândia, Holanda e Alemanha são exemplos de países que já estão adaptando sua legislação. Deputados do Brasil querem seguir a mesma tendência. Quem defende sua legalização diz que isso traria benefícios sociais às prostitutas, como carteira assinada e aposentadoria, e também para o governo, com a arrecadação de impostos. Há um outro grupo que defende que isso só traria mais degradação à família.
Uma parcela da sociedade brasileira acredita que a legalização resolveria os problemas dessas profissionais com relação à exploração que hoje ocorre. Dizem também que, uma vez reconhecida a atividade, elas poderiam usufruir dos mesmos benefícios concedidos a qualquer trabalhador, como plano de saúde, seguro desemprego e aposentadoria. Além disso, sustentam que o Governo também teria sua parte de benefícios, pois a arrecadação para o INSS e para o fisco, que hoje não acontece, passaria a ser lei.
No entanto, existe um outro grupo que defende que, como continuaria sendo estigmatizada, a legalização somente acarretaria mais danos à já prejudicada família brasileira. Alegam que essa atividade é um traço da desigualdade social imperante no Brasil e que jamais poderia adquirir “status” de profissão. Dizem também que a exploração continuaria, uma vez que a fiscalização em nossa terra é falha. Acrescentam ainda mais um argumento quanto às falhas da fiscalização: a saúde pública estaria correndo um sério risco, com a possibilidade de aumento das DSTs.
Apesar de muito antiga, a prostituição sempre será algo inadmissível socialmente. Dar sinal verde para que ela se transforme em profissão é dar uma sentença àquelas pessoas ligadas a ela de jamais saírem do patamar social no qual se encontram. A sociedade deve, antes, proporcionar estudo e formação profissional para que ninguém precise recorrer a uma atividade degradante como essa. O papel do Governo é garantir que todo cidadão tenha chance de conquistar uma vida plena, desempenhando atividades que sejam verdadeiramente uma carreira e que ofereçam a segurança necessária para a saúde e para o bem-estar social.


          Vamos agora interpretar o tema 1?
         O título, como já vimos, não antecipa muita coisa, por isso mesmo devemos ler o texto com bastante atenção. Pelo menos sabemos tratar de algum assunto relacionado a animais. Mas o que exatamente? Basicamente o texto põe em discussão “uma antiga polêmica: é justo que animais continuem sendo utilizados como cobaias em testes de laboratório?”. É polêmica porque, se por um lado esses testes trazem benefícios à área da medicina, por outro causam prejuízos irreversíveis aos animais, os quais indiscutivelmente se colocam numa posição de desvantagem em relação ao homem. Daí o título Humanos ou animais?, em que se confrontam os seres humanos e os animais.
         Para levá-lo a uma reflexão mais aprofundada sobre o assunto, o tema faz alusão a um projeto de lei que tenta proibir o uso de animais em experimentos científicos, o que, de certa forma, confere mais seriedade à questão. E as expressões sacrificar, impingir dor e submeter (…) a torturantes experimentações, logo no início do texto, parecem acentuar ainda mais o agravamento da situação. Nessa relação, prós e contras devem ser bem analisados a fim de que se chegue a um posicionamento claro, com argumentos coerentes e pertinentes. Uma vez ponderado o problema, você deve defender seu ponto de vista com relação a essa questão por meio de um texto dissertativo.
         Qualquer que seja o posicionamento assumido, a argumentação deve estar muito bem embasada, levando-se em conta todas as nuances da questão.

          Num tema de redação, tudo é relação!

         Você percebeu que a interpretação será tanto mais bem-sucedida quanto maior for a capacidade de se relacionarem informações textuais (aquelas presentes no próprio texto) e extratextuais (aquelas pertencentes a outros textos e às diversas situações da vida)?
         A técnica (se é que existe alguma) é basicamente a mesma para se interpretarem temas, o que muda são apenas as abordagens dos assuntos. Daí a razão de se ter o máximo de informação possível para se poder estabelecer as relações necessárias ao exercício da interpretação.
         Como os temas aqui apresentados têm exatamente o mesmo estilo, deixamos o tema 2 para você se divertir. E não tem outro jeito: só se aprende a ler lendo! Por isso, faça desse momento uma diversão.
          Boa leitura!