Texto narrativo (Em 12/05/15)


fenixidade.blogspot.com


Tema: “Para os grandes males, os grandes remédios! Tive que tomar essa decisão tão difícil em minha vida.”

           Narre uma história que aborde essa situação.



Turno Extra

Renan Augusto Oliveira de Carvalho


       Apoiei meus punhos na pia branca do banheiro. O sangue escorria da borda formando densas poças no chão. Um rastro quente, que me fez olhar para trás e, pela porta escancarada, ver seu pé inerte, para fora da cama, iluminado apenas pela luz neon do motel barato. Nossa relação... Santo Deus, Clara! O que fizemos?!
      Conheci Clara no trabalho. Reservada, calada e dona de “Um quadril mulato” e de “Um sorriso faceiro. Oh, Pai!” “Faxineira nova no 202?” Nada. Nem um olhar. Mas, como todo porteiro que se preze, sabia investir. Pescar, como dizia meu pai. E quando mordeu a isca... Ah! Foi desfile de Escola de Samba. Por diversas vezes, tive que inventar turnos extras. Sabe como é, né? Um pandeiro daquele num se toca em casa, não.
        E tudo corria bem nesse nosso passatempo “alegorioso”. Por vezes pensei em largar Cecília. Pedia-me inúmeras vezes. “Mas tem as criança, Clara!” Ficava calada e enrolando os pelos do meu peito nos seus dedos. Como fui burro... Como fui deixar acontecer...
        Então ela marcou no mesmo 14. Astolfo sabia. O quarto tinha nosso cheiro. Outro turno noturno. “Ainda de roupa, minha preta?” Nem arranquei a camisa e ela me jogou a bomba. “Grávida!? Mas que mer...” Parei encostado à porta. A cortina oscilou. Ela sentada na cama olhando para o chão. As mãos entrelaçadas junto ao colo. Eu a amava. Não amava?
       Não havia outra saída. Depois o Astolfo me ajuda. Ele não deixaria aquele “sangue tiziu” manchar a reputação do seu amigo aqui. Eu não podia ter mais problemas com a polícia. Nessa o amor vai ter de esperar!
      Atirei-me contra ela. Repuxei-a pelo cabelo e me joguei sobre seu corpo, como outrora, mas agora apoiando o travesseiro manchado sobre seu corpo. Grávida?! Também, com esse traseiro de parideira! A TV estava alta; ninguém escutaria se ela se debatesse muito. Senti, então, uma pontada na barriga. Urrei. A dor me fez perder a força da mão. Arquei-me sentindo a faca rasgar a lateral do meu corpo. Corri para o banheiro... Estava feito...
       No chão, com o punho esquerdo ainda apoiado na pia, no olhar vago, eu a vi aproximar-se da porta... “Por que, Clara?” Ela me fitou séria, sem remorso aparente:
        — Tem as criança, Laércio!