O tabu do incesto (Em 18/08/11)

geneticaecomportamentopsicologia.blogspot.com


          "Patrick e Susan Stübing (de 31 e 23 anos) formam um casal há oito anos, têm quatro filhos e se tornaram conhecidos quando decidiram lutar para eliminar o artigo 173 do Código Penal alemão, que penaliza com até três anos de cárcere privado o incesto. Patrick e Susan são irmãos e alegaram que a proibição legal é contrária à Constituição alemã, que garante a livre escolha em matéria sexual."

Leia mais em
http://www.mdig.com.br/index.php?itemid=2425#ixzz1VufXmXBj

          "O depoimento de John, 61, e Jenny Deaves, 39, pai e filha e também parceiros românticos, foi ao ar no domingo à noite, no programa 60 Minutes, da rede austrialiana Nine. 'John é meu pai e também meu parceiro. Não nos vemos como pai e filha. Não vejo John como meu pai, apesar de ele ser meu pai biológico', afirma Jenny na entrevista. 'Sou um homem que encontrou uma mulher e se apaixonou', diz John."

Leia mais em:

http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2008/04/080407_australiacasal_pu.shtml

A partir da reflexão sobre essa polêmica, a Turma Alfa da Segunda Série produziu um debate que resultou em alguns textos, todos muito bons. Selecionamos o da aluna Ana Paula Medeiros Ribeiro. O tema proposto foi A sociedade tem o direito de impedir os relacionamentos incestuosos consentidos, penalizando essa prática como crime?

Veja o que Ana Paula tem a dizer sobre o assunto.


Uma união perigosa
Ana Paula Medeiros Ribeiro
  
O amor incestuoso não é um caso muito comum na sociedade. Porém, ultimamente, algumas relações desse tipo vêm tomando lugar de destaque na imprensa internacional. O amor e o desejo são sentimentos muito particulares; cabe a cada pessoa o direito de escolher a quem amar e desejar. Uma relação incestuosa não causa aparentemente mal algum à sociedade de maneira geral. Entretanto, há que se considerar que os filhos frutos dessa relação podem sofrer anomalias genéticas e preconceitos. Além disso, a instituição familiar poderia ser seriamente comprometida.
A população concorda que o incesto é um tabu, mas ainda assim há pessoas que defendem que toda forma de amor é válida. Contudo, estudando a genética, o problema fica óbvio: os descendentes de relações incestuosas têm 50% a mais de chance de nascerem com anomalias. Tais anomalias podem ser tanto físicas, quanto mentais e são resultados do cruzamento de códigos genéticos muito semelhantes, como no caso de um casal de irmãos incestuosos. Na antiguidade, alguns membros das famílias reais egípcias se casavam com parentes próximos para manter a dinastia e para que sua riqueza não se espalhasse, e isso causava muitos casos de mutação genética.
Há chances, claro, de os descendentes de casais incestuosos nascerem saudáveis, mas, ainda assim, eles enfrentariam barreiras sociais grandes. Poderiam ser alvo de preconceitos e brincadeiras maldosas, ou poderiam ser isolados socialmente por conta de uma constituição familiar diferente dos padrões em vigência.
Com o devido acompanhamento psicológico, os filhos de relações incestuosas poderiam até chegar a ter uma vida saudável, porém haveria uma estrutura familiar confusa e difícil de ser entendida pela criança. Se um casal de irmãos incestuosos tivesse uma filha ou filho, por exemplo, a mãe dessa criança seria, ao mesmo tempo, sua tia.
Portanto, mesmo que uma relação incestuosa não cause prejuízos à vida social geral, certamente trará sérias consequências aos descendentes dessas relações e, portanto, deve ser considerada crime, já que coloca a integridade da vida social e psicológica de outros em risco.

O mendigo solitário (Em 16/08/11)

Tema: Tendo como companheiro apenas seus três cães, aquele mendigo parecia pedir muito mais do que apenas dinheiro.


O mendigo solitário
Lucas Saqueto de Lacerda

Desanimado e desmotivado, devido às dificuldades que a vida apresentava, estava eu, na sacada do prédio em que moro, a meditar e a reclamar de minha situação. Nesse momento, observei um pobre homem em uma calçada de um prédio abandonado. Com suas mãos sujas e calejadas, juntava seus papelões para poder se abrigar do frio. Tendo como companheiro apenas seus três cães, aquele mendigo parecia pedir muito mais que apenas dinheiro.
Com seus olhos tristes e apagados como uma flor murcha e seca, com cabelos compridos e sujos, pelos quais um pente dificilmente conseguiria deslizar, ele exibia uma barba quase completamente grisalha. Os pelos ao redor dos lábios já estavam bastante amarelados, devido ao seu vício em nicotina. Suas roupas, desgastadas pelo bater das pedras, somadas aos papelões, eram sua única proteção contra a friagem que faz em nossa região. Ali estava ele, sentado, naquela calçada empoeirada. As rugas, talvez até precoces, evidenciavam todo sofrimento pelo qual devia estar passando; e a sua carcaça, desnutrida pela fome que assolava aquele homem.
O mendigo solitário parecia buscar em seus cães sujos e magros, algo que definitivamente não conseguia encontrar nos seres humanos, como companheirismo, amor e um ombro amigo. O mundo para ele, mesmo sendo tão extenso e com tantos habitantes, parece ser como uma caixinha de fósforos: pequena, escura e apertada. Seu olhar às vezes se perdia no nada, aparentando estar com o pensamento longe, relembrando algo que já vivera ou talvez imaginando se um dia finalmente teria direito a uma vida digna e saudável. Nessa hora, talvez isso reacendesse seus sonhos e objetivos, como uma nova planta que surge do solo seco buscando ser acolhida pelo sol e produzir muitos frutos em um futuro melhor.
Aquela imagem me fez repensar minhas atitudes e enxergar que meus problemas, que pareciam ser tão absurdos, eram pequenos perto dos daquele homem, pois eu tenho amor, família, lar e recursos que me ajudam a superar facilmente as pequenas batalhas que a vida me oferece. Ele parecia, naquele momento, só poder contar infelizmente com seus três cães.

Praça de encantos (Em 16/08/11)

Tema: Depois de uma semana de trabalho árdua, nada melhor do que passear com a minha família na pracinha de minha cidade.

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Praça de encantos
Lourdes Gabriela Vieira Batista

Fim de semana é, com certeza, a recompensa para aqueles que se esforçaram, dia após dia, em seus serviços. Pensando em como desfrutar desse bônus, dei-me conta de que, depois de uma semana de trabalho árdua, nada melhor do que passear com minha família na pracinha de minha cidade. E foi exatamente o que fiz.
Ao chegar, logo avistei belos edifícios que contornavam a praça, assemelhada a um pedaço do paraíso em meio à selva de pedra. As árvores históricas, de troncos grossos, estavam repletas de folhas verdes e brilhantes. Quando acariciadas pela brisa, balançavam como se estivessem dançando a serenata com a qual os pássaros contentes e encantadores brindavam os recém-chegados. A imensidão azul do céu abrigava o sol de calor intenso e acolhedor presente naquele maravilhoso domingo. Também fazia parte do cenário uma banda agradável; ela acalentava nossos ouvidos com melodias agradáveis e suaves, enfeitando o coreto, alegrando todo o ambiente. As músicas tocadas traziam uma sensação de paz e nostalgia.
As crianças faziam a festa ao lado do pipoqueiro e do vendedor de algodão-doce; este transformava açúcar em pequenos pedaços de nuvens doces e coloridas; aquele brincava com milhos até virarem formas irregulares de sabor inigualável. Havia bancos brancos, de madeira. Seus assentos eram ocupados por casais românticos e contempladores da beleza estonteante que preenchia a paisagem, assemelhada a um quadro pintado por mãos divinas. A grama, verdinha, estava coberta por uma variedade de flores. O final de tarde foi marcado por uma garoa fina e nuvens escuras, que, ao mesmo tempo, escondiam o sol e nos contagiava com a pureza das cores de um arco-íris.
O transcorrer do domingo deixou em todos uma satisfação e a vontade de retornar sempre àquela pracinha. Praça que a todos cativava, repleta de encantos, os quais puderam proporcionar a mim e à minha família um dia perfeito.

Refúgio encantado (Em 16/08/11)

Tema: Depois de uma semana inteira de trabalho, nada melhor do que passear com minha família domingo na pracinha de minha cidade. 

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Refúgio encantado
Luana Garcia de Moura

Depois de uma semana inteira de trabalho, nada melhor do que passear com minha família domingo na pracinha de minha cidade. Saímos cedo de casa, o dia estava ensolarado, e um leve vento soprava do sul, dando uma boa sensação de frescor.
Chegando à praça, escolhemos uma pedaço de relva verdinha para forrar a toalha e colocar a cesta de comida sobre ela. Assento-me e observo que, alheios à paz daquela praça, os prédios gigantes que a circundam parecem ter vida; não descansam. Os carros na rua também, acelerados, buzinando, não dividem comigo a sensação de tranqüilidade que aquele lugar me proporciona. No centro da praça, noto uma fonte de água límpida e fresca, perto da qual as pessoas se sentam para sentir a brisa, e crianças debruçadas em sua beirada tentam tocar o jato que sai da boca de um leão do chafariz. Jovens e idosos caminham na pista de corrida, e o vai-e-vem das pessoas me faz achar interessante aquele ritmo. Ao longe, um casal disposto na grama; a moça, lendo um livro, e o rapaz, deitado com a cabeça em seu colo, ambos se deixam embalar pela harmonia e sossego do lugar.
Mais próximo de mim, um carrinho de pipoca todo colorido, de pipocas igualmente coloridas, chama a atenção de crianças e adultos, que talvez nem gostem mesmo de pipoca, mas que ficam encantados com a cor e a magia daqueles pequenos flocos de milho. Um pai e seu filho empinam um papagaio, que parece planar sozinho no céu de nuvens escassas. As folhas das árvores se movimentam com o vento, dando mais vivacidade ao lugar, fazendo com que todos se sintam mais livres, revigorados. Tudo me chama a atenção: os casais que conversam e riem espontaneamente; os velhinhos que jogam xadrez e vibram quando fazem uma boa jogada; as pombas que brincam atrás de comida. Talvez esse seja o melhor momento na semana das pessoas que na praça se encontram. De fato, o meu é.
O pôr-do-sol chega bonito, iluminando o final de tarde. O céu agora se transforma numa aquarela de tonalidades mais suaves. Infelizmente essa cena é também o sinal de que o domingo se vai; é chegada a hora de voltar para casa. E passarei a semana ansiosa, contando os dias para o próximo domingo, em busca da tranqüilidade no meu refúgio encantado: a praça da minha cidade.

Três bons exemplos de textos narrativos

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          A coluna "A palavra é toda sua" inicia em grande estilo. Estamos postando aqui o resultado de uma atividade proposta em sala de aula e que se baseava em três temas narrativos diferentes. Parabéns a seus criadores e esperamos que a leitura possa lhe ser agradável.
          Participe enviando sugestões ou comentando.
          E agora a palavra é toda sua!

Tema 1

Quando a criatura encantada lhe disse que ele teria direito a apenas um único desejo, ele, muito esperto, soube instantaneamente o que pediria.
— Se é assim, quero ter o dom de poder realizar todos os meus desejos, bastando para isso apontar apenas o meu dedo.
— Que assim seja, mestre! — disse a criatura com um sorriso irônico.

Crie uma narrativa na qual esse trecho seja inserido coerentemente.



Cuidado com o que se deseja
Ex-aluna do CFS

Pedro era um garoto muito arrogante; sempre reclamava de tudo e queria que as coisas fossem feitas a sua maneira. Queria que todos ao seu redor fossem condescendentes com seus caprichos e, quando as coisas não saíam ao seu contento, tinha ataques tão terríveis, que muitas vezes seus vizinhos pensaram em chamar a polícia para contê-lo.
Um belo fim de tarde, logo depois da escola, Pedro estava caminhando pela rua quando se deparou com uma garrafa de formato anormal em cima do meio-fio; abaixou-se, pegou-a e, como era afobado, em vez de admirar o peculiar acabamento da garrafa, começou a sacudi-la para ver se havia algo dentro. Porque não ouviu nenhum som, concluiu que deveria estar vazia. Quando estava prestes a jogá-la fora, percebeu ranhuras no casco, que era feito de vidro fosco, e levantou a garrafa contra a luz. Forçando a vista, percebeu alguns sinais que aos poucos foram se convertendo em letras. Pôde ler então a mensagem: “Abra-me!”.
O menino, convencido de que se tratava de uma brincadeira, decidiu não obedecer ao comando de uma estúpida garrafa. Ainda com o objeto na mão, caminhou mais um quarteirão e estacou no meio do caminho. A curiosidade ainda persistia. Escondeu-se atrás de um muro, olhou para todos os lados e, quando se convenceu de que estava sozinho, abriu a garrafa.
De dentro dela, saiu uma fumaça rosada que, ao se dissipar, revelou uma estranha criatura encantada que lhe disse que ele teria direito a um desejo; apenas um desejo. Pedro, muito esperto, soube instantaneamente o que desejaria.
— Se é assim, quero ter o dom de poder realizar todos os meus desejos, bastando para isso apontar simplesmente o meu dedo.
— Que assim seja, mestre! — disse a criatura com um sorriso irônico, desaparecendo logo em seguida.
Pedro correu para casa, doido para começar a realizar seus desejos, agora que possuía esse fantástico poder.
Ao dobrar uma esquina, deu um encontrão em uma menina. Refazendo-se do susto, ele viu que não era apenas uma menina; era simplesmente a menina mais cobiçada do bairro, a mais linda da região, pela qual Pedro era apaixonado.
— Agora vou me dar bem! — maquinou o menino, murmurando para si.
Pedro, discretamente, apontou o dedo para a menina e, baixinho, disse:
— Apaixone-se por mim.
A bela menina, como se estivesse em transe hipnótico, lançou sobre Pedro um olhar de malícia e gemeu docemente:
— Ai, meu Deus! Que gato!
O menino, apesar de ter sido atendido em seu desejo, mas ainda surpreso com o efeito que presenciava, encabulado, apontou o dedo para si mesmo e disse:
— Gato? Eu?
A partir desse dia, a bela menina, quando andava pelas ruas dali, era perseguida e assediada por um gatinho branco e fofo, sempre a miar e a ronronar em volta de suas pernas. E Pedro, menino caprichoso e malcriado, para estranheza de toda a vizinhança, nunca mais foi visto.



Tema 2

Era a nova vizinha; e era muito, muito bonita. Vivia só e não gastava conversa com ninguém dali. Mas, todas as noites, havia um entra-e-sai esquisito de rapazes muito alinhados do seu apartamento. Minha tia, muito puritana e fiscal da vida alheia, resolveu xeretar.

Crie uma narrativa cômica na qual esse trecho seja inserido coerentemente.


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Minha tia xereta e a nova vizinha
Al. Douglas Gautério Gonçalves da Silva (BEP/2010)

Eu morava com minha tia em um condomínio muito pacato, desses nos quais todos os vizinhos se conhecem e sabem da vida uns dos outros. Um dia surgiu ali uma pessoa que, por seu comportamento, acabou destoando dessa característica local.
Era a nova vizinha; e era muito, muito bonita. Vivia só e não gastava conversa com ninguém dali. Mas, todas as noites, havia um entra-e-sai esquisito de rapazes muito alinhados de seu apartamento. Minha tia Adelaide, muito puritana e fiscal da vida alheia, resolveu xeretar.
A rotina era sempre a mesma: por volta das vinte horas, iniciava-se a chegada dos rapazes. Em seguida, luzes começavam a piscar de forma irregular, pessoas conversavam e faziam todo tipo de barulho. Minha tia, de sua janela, ia ficando cada dia mais intrigada.
Eles chegam de noite, fazem a baderna deles e, lá pelas vinte e três horas, saem, dizendo estarem cansados, que é cansativo, mas que vale a pena... Alguns chegam a sair ajustando as roupas! Que pouca vergonha!
Duas semanas foi o tempo que minha tia levou para tomar coragem e ligar para a polícia, solicitando uma intervenção.
Tem um apartamento muito suspeito aqui e está incomodando a todos.
Na verdade, era apenas titia quem estava se sentindo incomodada.
Por favor, façam logo alguma coisa! Aquilo lá mais parece um bordel!
Pois não, madame. Estamos enviando uma viatura para aí agora mesmo. Mas antes a senhora, por gentileza, me passe os seus dados.
Menos de dez minutos depois, minha tia, debruçada em seu observatório, a janela, acompanha excitada a chegada da polícia.
Vianinha! — Vianinha era eu. — Vianinha, corre aqui, meu filho! Venha ver, que agora é que vão pegar a sirigaita!
Fui até onde ela se encontrava. Dali pudemos acompanhar o desembarque de dois policiais que se encaminharam para o edifício. Poucos minutos depois, os dois deixaram o prédio e atravessaram serenamente a rua, em direção à portaria de nosso bloco. A campainha tocou, e minha tia, como uma adolescente descontrolada, correu para abrir a porta.
Boa noite, senhora — cumprimentou um dos policiais. — A senhora é a Dona Adelaide?
Sim, sou eu mesma — empertigou-se titia.
Os dois policiais se entreolharam. Depois um deles, com expressão grave, disse:
Parabéns! A senhora acaba de nos fornecer um flagrante...
Minha tia, não aguentando mais de expectativa, o interrompeu:
E então? Fale logo! Vão levar a prostituta?
Como eu ia dizendo, a senhora nos forneceu um flagrante. Um flagrante de um estúdio fotográfico de modelos. A moça, na verdade, estuda moda à tarde e, durante a noite, tira fotografias de modelos masculinos. Se a senhora continuar achando isso vergonhoso ou algo assim, pode ligar; não para a polícia, mas para um psicólogo. No mais, faça-nos um grande favor, sim? Deixe a moça trabalhar em paz.
Pena que por perto não havia nenhum balde para eu enfiar a minha cabeça.


Tema 3

Meu pai me pedira para guardar aquela pequena caixa de madeira escura por tempo indeterminado e me fez jurar que eu jamais a abriria sem o seu consentimento.

Crie uma narrativa de mistério na qual esse trecho seja inserido coerentemente.



addhi-dhaiva.com.br

O maior de todos os presentes
Al. Fabiano de Oliveira dos Santos Matias (SGS/2010)

Era noite. A chuva que caía não dava trégua e se lançava sobre nossa casa torrencialmente. Como sempre acontece em noites de tempestade, a energia acabou. Eu, criança ainda, só poderia estar nervoso e muito assustado; e as estranhas formas tremulantes que o brilho das velas formava nas paredes simplesmente pioravam tudo, o que me levava a perguntar a todo instante:
Pai, quando a luz vai voltar?
Em breve, meu filho — dizia meu pai, puxando-me para perto de si. — Logo, logo a chuva vai diminuir, e a luz vai acabar voltando. Tem que ter paciência.
Eu queria que a mamãe estivesse aqui — eu gemi.
Sim, filho; eu sei. Eu também gostaria muito. Mas, de alguma forma, ela está aqui conosco. Temos de ser pacientes.
Meu pai ficara viúvo muito cedo. Eu não conheci minha mãe, e era ele quem tinha de fazer os dois papéis; ele era muito cuidadoso comigo. Foi por ver minha aflição é que hoje eu tenho certeza de que ele fez o que fez.
Deixando-me sozinho por uns instantes, foi até o quarto e voltou de lá com algo na mão. Reconheci logo o pequeno objeto: era uma caixa de madeira escura que ele mantinha em sua escrivaninha. Eu tinha curiosidade em saber o que havia ali dentro, pois ele já havia me falado que fora vovô quem lhe presenteara com ela ainda em sua mocidade.
O tempo passa rápido, não é, filho? — ele perguntou.
Passa, papai; que nem flecha, né?
Pois é. Hoje você já está com dez anos e já é quase um homem, não é?
Sim, papai.
Pois, então, é hora de lhe passar esse presente.
Naquele momento, ele me entregou a caixa de madeira. Eu já não me agüentava de curiosidade e já ia abri-la, quando ele me fez jurar que eu jamais a abriria sem o seu consentimento. Mesmo contrariado, eu sabia que tinha de obedecer. A luz ainda demorou algum tempo para voltar, mas, de alguma forma, meu medo desapareceu.
Vinte anos se passaram. A misteriosa caixa se manteve em meu poder. Sempre que eu passava por uma situação difícil na escola, no trabalho, em minha vida conjugal, eu me recordava daquela noite de tempestade com papai. A doença de meu filho caçula foi o pior de todos os momentos. Os médicos só diziam que eu devia ter paciência que o tratamento demoraria e que mesmo assim o resultado era incerto. Tive de ter um autocontrole que eu não conhecia em mim. Meu pai acompanhou tudo de perto. Até que um dia, finalmente, meu filho recebeu alta do tratamento. Nesse dia meu pai, estando em nossa casa para nos felicitar pela melhora, me pediu:
Filho, você ainda tem aquela caixa?
Sim, papai.
Pode apanhá-la, por favor?
Corri até o segundo andar da casa e voltei como uma flecha para a sala. Ele me disse:
Agora você já pode abrir.
Nervoso, eu atendi ao seu comando. Fiquei atordoado por alguns segundos. O silêncio que se formou então só foi quebrado por uma brejeira gargalhada dele, seguida de um abraço forte e carinhoso.
Foi a mesma cara que eu fiz quando seu avô me mandou abrir esse negócio. Esse é o maior tesouro de um homem. E, hoje, vejo que esse homem está bem na minha frente!
Aquela velha caixa não possuía nenhuma pedra preciosa, nenhum objeto valioso. Na verdade, ela estava vazia. Mas através dela percebi que já havia ganhado o meu maior presente: o autocontrole de saber aguardar pelo momento certo; a paciência do saber esperar.



Os detalhes fazem toda a diferença (22/08/11)

 
Vanessa Nix
            

           Conforme já comentamos na análise da postagem anterior, a descrição não é uma enumeração exaustiva de detalhes. Pressupõe observação seletiva para captar as características mais expressivas do objeto observado, ou seja, aquelas que mais impressionaram a percepção sensorial do observador, responsáveis pela construção da imagem retratada.
          O exercício da descrição é, pois, um exercício de verbalização das impressões. Aquele que se propõe a descrever uma pessoa, um ambiente ou uma paisagem se vê, assim, diante da missão de transformar em PALAVRAS as suas sensações corporais a fim de formar um quadro ou uma cena. Mas, diferentemente destes, que possibilitam a quem os vê observar todo o objeto praticamente de uma só vez, o texto vai apresentando ao seu leitor o ser retratado gradativamente, linha a linha, de modo que o leitor vai construindo a imagem aos poucos, por partes. E isso, obviamente, exigirá um trabalho mais cuidadoso com a linguagem.
           Você não sabe como? Calma! É por isso que estamos aqui, para ajudá-lo nessa tarefa. Você já deve ter ouvido falar em frases nominais. E para que elas servem mesmo? Vamos recordar juntos.
Repare nestas frases: Adriano é encantador. Maria Júlia está tranquila. Fernando continua atencioso. Mariana parece contente. O que elas têm em comum? Isso mesmo! Todas possuem verbo de ligação, que são: é, está, continua e parece. Mas que efeito eles provocam? Como o próprio nome nos revela, esses verbos servem para ligar o predicativo, ou seja, a qualidade do sujeito ao sujeito e realçam, portanto, as qualidades do ser. Desse modo, quando dizemos Adriano é encantador. Maria Júlia está tranquila. Fernando continua atencioso. Mariana parece contente, esses enunciados estão traduzindo uma visão estática do mundo; é como se fosse uma fotografia. (MESQUITA, 1994, p. 381). Estou vendo cada um desses seres parados, possuidores de uma qualidade: Adriano encantador. Maria Júlia tranquila. Fernando atencioso. Mariana contente.
Assim, quando se deseja ressaltar uma qualidade ou um estado de um ser a fim de caracterizá-lo, um dos recursos de que a língua dispõe é a chamada frase nominal. Por essa razão, elas costumam aparecer em textos descritivos. Essas frases podem também assumir outra estrutura; muitas vezes o verbo não vem explícito, podendo ser facilmente deduzido pelo contexto, como se pode observar no exemplo a seguir:
O mendigo apresentava todas as marcas que o tempo e o sofrimento lhe impuseram: olhos profundos como a noite, cabelos negros oleosos, dentes amarelados pelo tabaco, pele castigada pelo sol, mãos e pés encardidos pela fuligem. Tinha como amigos apenas seus três cães.

Assim dispostas no período, as frases nominais sem verbo desempenham uma função sintática específica e constituem o chamado aposto enumerativo, utilizado para enumerar as "marcas que o tempo e o sofrimento lhe[ao mendigo] impuseram" e colaboram para formar um retrato do mendigo. Veja o mesmo trecho reescrito com verbos: (seus) olhos (eram) profundos como a noite, (seus) cabelos (eram) negros oleosos, (seus) dentes (eram) amarelados pelo tabaco, (sua) pele (era) castigada pelo sol, (suas) mãos e pés (eram) encardidos pela fuligem. Tinha como amigos apenas seus três cães.
Mas, atenção! Dependendo de como essas frases aparecem no período e de onde se localizam no texto, elas podem, na verdade, prejudicar a fluência das ideias e, com isso, comprometer o estilo. Observe as mesmas frases nominais transcritas no texto abaixo:
Caminhando apressadamente como fazia todos os dias no horário do almoço, passei, como de costume, por aquele beco estreito que me servia de atalho. Não esperava, no entanto, me deparar com aquela figura humana que mais parecia o retrato da tristeza e melancolia: um mendigo.
Com olhos profundos como a noite, cabelos negros oleosos, dentes amarelados pelo tabaco, pele castigada pelo sol, mãos e pés encardidos pela fuligem. O chinelo de couro já sem tiras como um velho clamando sua aposentadoria. O chapéu cansado de esperar por esmolas. Observava a todos, sem ser observado por ninguém.
As frases nominais agora se situam no início do segundo parágrafo do texto, que, conforme o esquema básico (também já comentado neste blog), corresponde ao primeiro parágrafo do desenvolvimento, onde se encontram as características físicas da pessoa. Introduzidas pela preposição com, passam a funcionar como adjunto adverbial e, por esse motivo, requerem, no mesmo período, um sujeito e um verbo que o acompanhem. Qual a função de um adjunto adverbial sozinho num período? Gramaticalmente falando, um adjunto adverbial isolado não compõe uma frase e, portanto, não possui sentido completo.
Mas, peraí! Não está claro que se trata das características do mendigo, mencionado no final do parágrafo anterior, o qual corresponde à introdução do texto? Qual o problema, então, de se romper com as regras gramaticais e se criar um estilo original?
De fato, são inúmeros os recursos estilísticos que rompem com as normas gramaticais e que, dependendo do contexto, se consagram como verdadeiras criações literárias. Mas, para que surtam o efeito desejado, a intenção artística tem de estar muito bem clara a fim de que não seja mal interpretada. Acontece que, num texto de aluno, do qual não se espera, por sua condição de "aprendiz", construções muito inusitadas porque estas pressupõem total domínio gramatical, produções desse tipo não são previstas e, por essa razão, não devem ser aceitas.
O aconselhável nesses casos é seguir o que dita a norma padrão e obedecer às regras de constituição da frase. Isso sem contar o fato de que é preciso se compor uma imagem do objeto retratado. Se a enumeração de detalhes não tiver uma função sintática clara na frase, dificilmente ela constituirá um retrato. Por isso, prefira as frases mais curtas, se possível com verbo explícito, e tente organizar as ideias em pequenas tomadas, de maneira que, ao final, elas formem um todo harmonioso dentro de um quadro maior. Que tal praticar agora?
Aproveitando aquela enumeração, divida-a em períodos de estrutura sintática completa, como, por exemplo, a que se segue: Com olhos profundos como a noite, parece não fixar o olhar em nenhum ponto específico. Seus cabelos negros oleosos confundem-se com sua barba densa, a qual, por vezes, revela dentes amarelados pelo tabaco. Na pele castigada pelo sol, notam-se cicatrizes de uma vida difícil, sustentada por mãos e pés encardidos pela fuligem.
Você concorda que, da maneira como foi reescrito, esse trecho parece mais significativo? E sabe por quê? Porque agora os detalhes, inseridos em períodos fluentes (formados por orações com sujeito e predicado) e bem-articulados (graças a pronomes e preposições), assumem contornos distintos, que compõem um quadro maior, no caso aspectos físicos predominantemente da cabeça.
Assim como um pintor, para compor o seu quadro, mistura cores e utiliza pincéis e utensílios os mais variados a fim de produzir os efeitos desejados, o escritor também deve dispor de todos os recursos da língua para produzir um texto rico e expressivo, capaz de traduzir em palavras o que o corpo capta por meio das sensações.
Pense nisso!


"Até que a morte os separe"

Tema:
            “Os casamentos duravam muito mais em épocas passadas, porque os pais escolhiam os noivos para as filhas. Essa era uma prática saudável, que deveria ser resgatada para o bem das famílias” (Ivanilda Cunha, 69 anos, aposentada).

Você concorda com a opinião exposta acima?



veja.abril.com.br

A duração dos casamentos

Aluna Esther Ribeiro (BSP, Turma Delta/Segunda Série/2011)
Texto postado no dia 13/04/2011

Na sociedade moderna, a maior parte dos casamentos já não dura mais tantos anos quanto já durou no passado. Tornou-se comum ver casamentos que duram apenas alguns meses e pessoas que se casam mais de uma vez. Há quem ainda acredite que a prática de se escolherem noivos e noivas para os filhos possa trazer de volta a fidelidade ao “até que a morte os separe”. Entretanto, essa visão não corresponde à realidade dos fatos. Em épocas passadas, os casamentos duravam mais porque as mulheres eram extremamente dependentes de seus maridos. Além dessa dependência, caso viessem a se separar deles, passariam a ser mal vistas pela sociedade, coisa que, de modo geral, não mais acontece. É válido lembrar também que os noivos eram escolhidos muitas vezes por motivos financeiros; para os pais era inadmissível ver suas filhas perderem bons partidos.
As mulheres contemporâneas são independentes. Muitas moram sozinhas e trabalham, são donas de si mesmas. Apesar de algumas ainda receberem salários inferiores aos dos homens, quando comparados, elas vêm aumentando gradativamente sua presença no mercado de trabalho. E já não é tão difícil encontrar aquelas que recebem até mais que seus maridos. Quando se casam, fazem-no por sua própria vontade, fruto de uma escolha pessoal. A mulher de hoje já não admite facilmente ser controlada ou ter de demonstrar submissão. Essa figura, da mulher submissa aos desejos do marido, ficou para trás. As decisões são tomadas dentro de uma relação que se desenvolve de igual para igual. Homens e mulheres conversam e tomam decisões juntos, visando o bem comum.
A independência financeira da mulher lhe trouxe mais confiança. A mulher não mais tolera a infelicidade conjugal por medo do julgamento de terceiros. Quando se sente insatisfeita no casamento, busca o diálogo e a solução dos problemas. No entanto, se não encontra respostas para seus anseios, é capaz de pôr fim à relação desgastada, enfrentando corajosamente a opinião dos demais. Até porque a sociedade já não imputa mais a culpa pelo fracasso de um relacionamento somente à mulher, como fazia antes.
Um outro fator que propiciava a longa duração dos matrimônios era o fato de os pais não admitirem que suas filhas dispensassem “excelentes partidos”, conforme se dizia. Tais partidos eram tanto melhores quanto maiores fossem suas posses. Ou seja, muitos casamentos eram verdadeiras relações comerciais. Os pais, cientes da dependência da mulher em relação aos maridos, tomavam tal atitude, até para se certificarem de que suas filhas não sairiam de casa para passar por necessidades materiais e financeiras no novo lar, preocupação que até hoje se nota nos pais mais zelosos.
A solução para a maior duração dos casamentos, se é que existe uma, vai além de os pais escolherem os noivos para os filhos, mesmo que se saiba que, de alguma forma, eles podem influenciar ainda na escolha. Talvez seja preciso haver mais respeito como base dos relacionamentos. A sociedade, e principalmente os homens, deve compreender que as mulheres não mais se enquadram no estereótipo do sexo frágil, indefeso; elas são agora uma voz a ser ouvida nas decisões, sejam elas referentes à dinâmica do trabalho, sejam ao âmbito social e, mais ainda, às escolhas relacionadas a sua própria vida, como a de um casamento.

Módulo de narração (30/04/2011)

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Você, que é da primeira série, já iniciou o módulo do curso dedicado aos estudos a respeito dos atributos de um texto narrativo. Portanto, deve estar descobrindo, a cada aula, que existem muitos aspectos técnicos a serem considerados na hora de se compor um texto narrativo de estilo clássico em situações de avaliação. Mas há outras dimensões não físicas nesse tipo de texto (produzido com intuitos avaliativos) para as quais temos chamado sua atenção desde o módulo de descrição.
Sempre reforçamos, em nossas aulas, a necessidade de que você compreenda que todo texto é uma janela através da qual se avista o interior da pessoa que o compôs. Por meio de um texto, o avaliador habilidoso tem a possibilidade de deduzir algumas coisas importantes sobre aquele que escreve: se possui senso de organização, se sabe hierarquizar as ideias com as quais irá trabalhar, se possui maturidade linguística e psicológica, se possui muita ou pouca experiência de vida, se tem proficiência em leitura e conhecimento das várias dinâmicas discursivas passíveis de serem veiculadas em um texto e muitos outros sinais que são transmitidos por meio da linguagem.
Assim, o momento da interpretação de um tema é decisivo para a boa condução do que se irá colocar na folha de papel. A preocupação então é: o que vou veicular no texto a meu respeito para que meu avaliador me identifique como alguém apto para ocupar o lugar que estou pleiteando?
Há uma infinidade de temas que podem ser sugeridos em um processo de avaliação que se valha da narração para cumprir seus propósitos. E você sabe que precisa estar preparado para qualquer um que lhe caia às mãos. Não subestime nenhum tema; qualquer que seja ele, foi feito por profissionais que sabem o que estão buscando. E não existe tema impossível de ser desenvolvido. Tudo pode ser desenvolvido com criatividade.
Veja, por exemplo, a situação seguinte, na qual o tema propõe que animais devam interagir em uma narrativa.


Tema:

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        Uma formiga estava caminhando tranquilamente rumo ao formigueiro de algumas amigas, quando um enorme elefante se colocou no seu caminho, obstruindo a passagem.
Pode parar aí mesmo! — bradou o elefante com voz poderosa. — Aonde você pensa que vai?
Surpresa, a pequena formiga lançou suas anteninhas em direção ao alto.
Ué! Estou indo visitar umas amigas lá do Formigueirão.
Daqui você não passadisse o paquiderme dando um pisão que reverberou na terra.

        Desenvolva uma narrativa inserindo na íntegra o trecho acima de forma coerente.


Repare que o tema envolve animais que falam e participam de uma dada realidade que os fará interagir. Mas que problema haveria aqui? Que riscos o candidato poderia correr? Bom, nossa experiência tem demonstrado que alguns não sabem aproveitar com muita propriedade um tema como esse, desenvolvendo narrativas cujo resultado é apenas, digamos, infantil, pueril, sem índices de maturidade de quem escreveu. É muito importante perceber que, em situações de avaliação, você não escreverá para uma criança, mas para um adulto hábil em leitura.

Veja o que estamos querendo dizer, lendo o texto que se segue.


A formiga avassaladora que não levava
desaforo para casa contra o paquiderme valentão

        Uma formiga estava caminhando tranquilamente rumo ao formigueiro de algumas amigas, quando um enorme elefante se colocou no seu caminho, obstruindo a passagem.
Pode parar aí mesmo! — bradou o elefante com voz poderosa. — Aonde você pensa que vai?
 Surpresa, a pequena formiga lançou suas anteninhas em direção ao alto.
 — Ué! Estou indo visitar umas amigas lá do Formigueirão.
         — Daqui você não passa — disse o paquiderme dando um pisão que reverberou na terra.
          — Posso saber por quê? — quis saber a formiga.    
          — Eu decido quem vai ou não passar por essa estrada e, ainda assim, somente depois de pagar pedágio. Sou extremamente forte e esmago quem quer que seja com minha pata. Além do quê, eu não temo nada, e não me custaria esforço algum estraçalhar você agora mesmo, sua petulante!
         — Você pode ser muito valente lá pras suas negas, mas comigo é no miudinho! — retrucou a formiga.
          — Ah, é?! — espantou-se o elefante.
          — Vem que eu te mostro, bandido!
         Teve início um combate sangrento e desigual. A formiga era realmente bem menor que o elefante. Só que este ignorava que ela era mestre em “Forming-Fu”, e, após alguns minutos, o paquiderme, cansado de ser sacudido como um saco vazio para todo lado, não teve outra escolha a não ser sair correndo.
        Aproveitando-se de suas habilidades marciais, quem está no comando do pedágio atualmente é esse pequeno mas poderoso inseto.

***
  Apesar de contar uma história e cumprir com algumas expectativas sobre o texto narrativo, ele apela para um humor talvez inadequado para a situação de sua produção, além de ressaltar aspectos negativos. Repare que a formiga soluciona a questão por meio de violência, o que é condenável sob todos os prismas, além de, ao final da narração, passar a ocupar o lugar do elefante no ato desonesto de extorquir dinheiro daqueles que passavam pela estrada. Veja então que não se trata de um problema de linguagem ou de questões gramaticais somente; trata-se da veiculação de valores, que serão representativos das ideias do produtor do texto.
  Vejamos agora este outro exemplo:

Paixão à primeira trombada

        Uma formiga estava caminhando tranquilamente rumo ao formigueiro de algumas amigas, quando um enorme elefante se colocou no seu caminho, obstruindo a passagem.
Pode parar aí mesmo! — bradou o elefante com voz poderosa. — Aonde você pensa que vai?
Surpresa, a pequena formiga lançou suas anteninhas em direção ao alto.
Ué! Estou indo visitar umas amigas lá do Formigueirão.
         — Daqui você não passa — disse o paquiderme dando um pisão que reverberou na terra.
         — Ai, adorei!
         O elefante ficou confuso.
         — O que foi que você adorou?
         — Sei lá. Esse seu jeito másculo de ser. Isso mexe comigo, sabe? — disse a formiga revirando os olhinhos.
         O elefante olhou bem para o pequeno inseto e reparou que ela era bem jeitosa.
         — Sabe, estive pensando — provocou o elefante. — Que tal dar um passeio em minha tromba?
         Foi amor à primeira trombada. Os dois se casaram e tiveram um casal de filhos: uma formiga gigantesca, que, em vez de antenas, exibia uma belíssima tromba, e um elefante de seis patas do tamanho de e preto como um besouro. E foram felizes para sempre.

***

         Aqui temos o tema sendo resolvido por uma situação também sem atributos que revelem algo de positivo sobre o escritor, a não ser o bom humor. Mas pode ser o caso de seu avaliador não estar procurando humoristas. Além disso, uma das falas do elefante contém um duplo sentido perigoso quanto ao bom gosto que deve ser condizente com o contexto formal de avaliação. Situações que insinuem erotismo podem depor contra o estilo e são verdadeiras armadilhas para o candidato.

         Qual seria a chave para se trabalhar então com temas que ofereçam animais como personagens? Bom, você já deve ter ouvido falar algo sobre as fábulas. Nelas os animais, comportando-se como humanos, vivem algum conflito cuja resolução deixará para o leitor uma mensagem, cumprindo, dessa forma, com uma função pedagógica, sempre presente nesse tipo de texto. Há sempre uma “moral da história”, não é mesmo? A raposa e as uvas, A tartaruga e a lebre, O sapo e o escorpião são fábulas muito famosas, e possivelmente você deve conhecê-las, além de algumas outras.
         Então, haver animais em um tema não pressupõe que você deva criar uma história infantil ou contar uma piada. Por história infantil entenda-se aquela da qual não é possível sequer retirar uma mensagem que suscite algum tipo de reflexão construtiva, efeito de fato revelador dessa autocrítica madura sobre a qual temos discorrido. E, ao contrário do que se pode pensar, existe muita criança que já apresenta indícios dessa maturidade linguística e psicológica, guardadas, obviamente, as devidas proporções, e adultos que ainda se encontram numa espécie de "infância da leitura". Muitas vezes, a idade cronológica não corresponde à idade psicológica. E isso é facilmente depreendido dos textos pelos leitores mais experientes. Aliás, se atentarmos para o estilo das fábulas, veremos que as lições ali veiculadas se aplicam a todos, principalmente aos adultos, já que constituem ensinamentos sobre a vida, sobre o comportamento humano.
          Veja agora dois exemplos de aproveitamento bem-sucedido desse tema.


Grandes problemas, pequenas soluções

Uma formiga estava caminhando tranquilamente rumo ao formigueiro de algumas amigas, quando um enorme elefante se colocou no seu caminho, obstruindo a passagem.
Pode parar aí mesmo! — bradou o elefante com voz poderosa. — Aonde você pensa que vai?
Surpresa, a pequena formiga lançou suas anteninhas em direção ao alto.
Ué! Estou indo visitar umas amigas lá do Formigueirão.
Daqui você não passa — disse o paquiderme dando um pisão que reverberou na terra.
E eu posso saber por quê? — inquiriu o miúdo inseto.
Eu decido quem vai ou não passar por essa estrada e, ainda assim, somente depois de pagar pedágio. Sou extremamente forte e esmago quem quer que seja com minha pata. Além do quê, eu não temo nada, e não me custaria esforço algum estraçalhar você agora mesmo, sua petulante!
Ai! Essa é nova! — disse aborrecida a formiga.
Não havia o que fazer. Por mais que ela argumentasse, o elefante apenas sacudia negativamente a tromba e exigia o pagamento pela liberação da passagem.
Pensando no que dissera o elefante, a formiga teve uma ideia.
Quer dizer que você não vai me deixar passar?
Não!
Então me faça um favor, sim? Não arrede pé daí, que eu já volto.
O elefante pareceu confuso.
Algumas horas depois, parado na mesma posição, o elefante sentiu um pequeno cutucão na pata.
Ei, gorducho!
Era a formiguinha.
Quero lhe apresentar um amigo meu.
Ao virar a cabeça para o lado oposto do da formiga o elefante gelou e, num pulo, aterrorizado, embrenhou-se pela mata, liberando a estrada.
Após rirem muito, os dois amigos se despediram.
Obrigada, compadre rato. Acho que demos uma baita lição nesse elefante.
Ah! Para você estarei sempre às ordens! E muito obrigado pelo queijo! Tenho certeza de que estará maravilhoso!
Então, a formiga pôde retomar tranquilamente seu caminho com a convicção de que os problemas, por maiores que sejam, às vezes podem possuir uma solução bem simples.

***

Nessa narrativa, aproveitou-se o fato bastante conhecido por todos e explorado inclusive por desenhos animados sobre o peculiar medo que os elefantes têm de animais miúdos, como os ratos. Através das ações que se passam, podemos concluir que ninguém é tão forte e poderoso que não possua alguma fraqueza. A formiga conhecia qual era a do elefante e explorou isso para lhe dar uma lição. O título Grandes problemas, pequenas soluções remete ao título de um programa sobre economia e empreendimento exibido em uma importante emissora de televisão do país: Pequenas empresas, grandes negócios. Isso revela um pouco do conhecimento de mundo do autor e estabelece uma intertextualidade cuja dimensão significativa remete ao campo profissional, econômico, do empreendedorismo.
A mensagem do texto é clara: por maior que seja o problema, ele pode possuir uma solução bem simples. Aliás, muitas soluções simples já sanaram problemas cuja resolução parecia difícil ou, em alguns casos, impossível. Apesar de não ser necessário proceder como nas fábulas, inserindo no último parágrafo uma moral da história, pois a história narrada por você pode muito bem ser autoexplicativa, julgamos necessário aliar ao desfecho algo sobre o conteúdo da mensagem, mas ainda assim de forma narrativa, ao revelar a convicção da formiga sobre essa ideia após todo o ocorrido.


E por último:

A formiga e o elefante

Uma formiga estava caminhando tranquilamente rumo ao formigueiro de algumas amigas, quando um enorme elefante se colocou no seu caminho, obstruindo a passagem.
Pode parar aí mesmo! — bradou o elefante com voz poderosa. — Aonde você pensa que vai?
Surpresa, a pequena formiga lançou suas anteninhas em direção ao alto.
Ué! Estou indo visitar umas amigas lá do Formigueirão.
Daqui você não passa — disse o paquiderme dando um pisão que reverberou na terra.
E eu posso saber por quê? — inquiriu o miúdo inseto.
Eu decido quem vai ou não passar por essa estrada e, ainda assim, somente depois de pagar pedágio. Sou extremamente forte e esmago quem quer que seja com minha pata. Além do quê, eu não temo nada, e não me custaria esforço algum estraçalhar você agora mesmo, sua petulante!
Ai! Essa é nova! — disse aborrecida a formiga.
Não havia o que fazer. Por mais que ela argumentasse, o elefante apenas sacudia negativamente a tromba e exigia o pagamento pela liberação da passagem.
Mas, como todos sabem, as formigas são insetos muito inteligentes, e a formiguinha resolveu tentar uma estratégia.
Gozado!
O que que é gozado? — quis saber o elefante com um olhar simulando enfado.
Daqui de onde me encontro o senhor não me parece assim tão alto, não.
Ah, é? E quem está me falando isso? Uma formiga?! Vê se te enxerga!
Não, é verdade! O senhor é bem baixinho até!
Ah, mas é agora que eu te esmago! — gritou o paquiderme.
Mas a formiga foi mais rápida:
Não, não! Não é preciso violência. Veja: eu posso estar certa ou errada quanto à sua altura. Mas para termos certeza, não seria melhor que o senhor me levantasse com sua tromba acima de sua cabeça? Daí então eu posso calcular exatamente quanto o senhor mede. Se eu estiver errada, prometo que vou em casa buscar dinheiro para pagar em dobro o pedágio.
O elefante gostou da ideia; tinha curiosidade em saber sua altura. Além do mais, ele tinha certeza de que a formiga estava errada, o que lhe renderia um bom pedágio.
Ok! Combinado!
Ele então ergue a formiga acima de sua cabeça.
Mais alto, seu elefante! — pedia a formiguinha. — É; pode descer. Eu estava errada, mesmo. Vou já em casa trazer para você o dinheiro.
E vê se não demora, sua tonta! — bufou o elefante.
Este ficou ali esperando. E deve estar lá até hoje, pois, quando a formiguinha estava nas alturas, em cima de sua tromba e acima da enorme cabeça, pôde enxergar uma outra estrada que passava ao largo e que a levaria ao mesmo destino. Seguiu por ela tranquilamente, com a certeza de que muitas vezes é no próprio problema que podemos encontrar a chave para nos livrarmos dele.

                                                                      ***

As fábulas que narram conflitos dessa natureza (tentativa de se impor algo por meio da força bruta) costumam revelar que as personagens ameaçadas por antagonistas dessa natureza, para se verem livres da situação, contam com sua inteligência. Algum tipo de disputa é proposta, algum jogo mental, um desafio, por meio dos quais a protagonista consiga se sair bem. Essa foi a chave para a resolução do conflito gerado nesse último texto. Além disso, a mensagem sugere algo importante para a vida: a análise ponderada de um problema pode revelar que o necessário para sua resolução pode se encontrar em sua própria natureza; ou seja, em um problema, podemos encontrar respostas para o mesmo problema. Isso é algo fundamental para as relações sociais e, principalmente, para o universo profissional.
Que tal aproveitar e fazer uma pesquisa sobre as fábulas? Elas, além de oferecerem muitos ensinamentos, podem servir de inspiração para muitas outras histórias a serem ainda criadas; a sua pode estar só esperando por isso. Leia. Pesquise. Produza.

Um abraço.